25/04/2016 08:19 - O Globo
Com grande parte da Ciclovia Tim Maia interditada após o desabamento que matou duas pessoas, as pistas da Avenida Niemeyer viraram opção para ciclistas e pedestres, que disputaram espaço com carros. Algumas pessoas correram riscos se equilibrando sobre a mureta. Três dias após o acidente que deixou dois mortos na Ciclovia Tim Maia, ciclistas e pedestres usaram a Avenida Niemeyer como área de lazer, mesmo correndo risco de atropelamento. A Guarda Municipal fez ontem quatro bloqueios na ciclovia, interditando o acesso ao local do desabamento a partir do Vidigal e da subida da Niemeyer. Com isso, muita gente decidiu usar o asfalto para pedalar ou correr — disputando espaço com veículos, que circulavam nos dois sentidos — ou até mesmo caminhar pela mureta.
Custodio Coimbra Passeio arriscado - Com os acessos à Ciclovia Tim Maia interditados pela Guarda Municipal, ciclistas disputam espaço com os carros na Avenida Niemeyer
Como faz aos domingos, o pescador Jorge Souza, de 60 anos, morador da Rocinha, foi andando pela avenida e desceu por um caminho junto à ciclovia para pescar. Ele conta que no dia do acidente estava na área conhecida como Castelinho, perto da Gruta da Imprensa, e saiu 30 minutos antes da queda da ciclovia.
— Eu fui pescar, mas estava com pouco peixe. Uma hora veio uma onda muito alta e eu decidi sair — diz ele, que conhecia o gari comunitário Ronaldo Severino, um dos mortos no acidente.
Já o economista Miguel Ramalho, de 35 anos, foi ontem à Avenida Niemeyer para pedalar. Ele acha que, mesmo após o reparo, vai demorar para ter coragem de voltar à ciclovia.
— Poderia ter sido comigo. Não sei se vou confiar nessa ciclovia. Quem me garante que o reparo será bem feito? Se erraram feio antes, quem me garante que não vão errar de novo?
Para técnicos, falta de fixação da pista aos pilares pode estar entre as causas
A queda de parte da ciclovia Tim Maia deixou a população perplexa. O questionamento é: como é possível, apenas três meses depois de inaugurada, parte da pista, que custou R$ 44,7 milhões, tenha desabado? Muitas são as hipóteses para que a estrutura não tenha suportado a fúria do mar, mas entre as principais estão o fato de a força das ondas ter sido subestimada e o de a pista estar apenas apoiada nos pilares de sustentação.
Luiz Carneiro, diretor do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia ( Crea- RJ), diz que o ideal era que o tabuleiro ( a pista) estivesse preso às pilastras:
— Vimos que o tabuleiro da ciclovia estava apenas apoiado justamente em um lugar com incidência dessa força que vem de baixo para cima. É uma falha que não tem desculpa. O projeto tem que levar em consideração o efeito da onda, não só para o tabuleiro, mas para tudo, inclusive para o pilar.
O engenheiro civil Roberto Lozinsky, especialista em estruturas metálicas, também sugere que a falta de fixação da ciclovia aos pilares aliada à força da onda pode ter causado o acidente. Para ele, ainda há o agravante de que, naquele trecho da Niemeyer, há uma falha na rocha, que faz com que a onda ganhe ainda mais força:
— Ali tem uma diferença geológica. Quando a água entra na fenda, ela adquire uma força muito maior. A plataforma não estava ancorada devidamente. Pelo que parece, ela estava simplesmente apoiada.
O engenheiro Antônio Eulálio, conselheiro do Crea, também disse que a força das ondas foi subestimada. Ele ressalta ainda que, ao visitar o local do acidente, percebeu que o trecho que desabou tinha apenas uma viga em sua estrutura, diferentemente de outras partes da ciclovia, característica que também pode ter influenciado na queda:
— O engenheiro desprezou ou subestimou a força das ondas. Quando projetamos estruturas no mar, como plataformas de petróleo, calculamos o efeito da onda mais forte dos últimos cem anos para fazer o projeto.
CONSÓRCIO DIZ QUE OBRA SEGUIU PADRÕES TÉCNICOS
O consórcio Contemat/ Concrejato, responsável pela obra da ciclovia na Avenida Niemeyer, informou ontem, por meio de nota, que “lamenta profundamente o acidente” e que “se solidariza com as famílias das vítimas”. Anunciou ainda que uma investigação interna, com a participação de consultores independentes, foi aberta para avaliar se alguma atividade sob a responsabilidade do consórcio contribuiu para o desabamento.
A empresa diz que, na obra, “executou integralmente todos os requisitos técnicos previstos no edital de licitação e no projeto básico fornecido pela contratante ( a prefeitura)”. Segundo a nota, “os materiais empregados e a qualidade da construção seguiram todos os padrões técnicos previstos nas normas”.
A empresa explicou que obras complexas, como a da ciclovia, seguem as orientações do projeto básico, desenvolvido a partir de estudos técnicos de viabilidade. A nota do consórcio diz ainda que a fiscalização das obras foi exercida pela prefeitura, “não tendo sido apontada qualquer irregularidade”.
O Estado de SP
Com ciclovia interditada, ciclistas e pedestres se arriscam no Rio de Janeiro
Ciclistas e pedestres caminham ou andam de bicicleta em trechos estreitos, onde carros e ônibus passam em alta velocidade
A interdição de parte da Ciclovia Tim Maia, na Avenida Niemeyer, zona sul do Rio, não conteve ciclistas e pedestres, que, na manhã de domingo, se arriscavam pela pista de carros nos trechos onde não podiam passar por causa do bloqueio - alguns até por curiosidade. A reportagem flagrou diversas pessoas caminhando ou andando de bicicleta em trechos estreitos, onde carros e ônibus passam em alta velocidade.
Parte da ciclovia está interditada, mas quem inicia o percurso pelo Leblon consegue caminhar até a região do Vidigal, onde há um primeiro bloqueio. Apesar disso, há quem passe pelo local e siga a caminhada. Já quem tentava entrar por São Conrado não conseguia passar. Além do bloqueio, havia policiais monitorando a passagem.
Apesar da barreira, o empresário Olimpio Freire, de 52 anos, manteve o percurso que faz todos os domingos de bicicleta. Ele percorre com amigos um trecho que vai do Flamengo, na zona sul, a São Conrado. Ao se deparar com o bloqueio, decidiu seguir pela pista de carros. "Já usava a pista antes de ficar pronta a ciclovia. Sei que é perigoso, mas não há outra opção. E no domingo há menos carros."
O comerciante Heraldo Alves, de 40 anos, também passava de bicicleta pela pista de carro no local da interdição. "Fui pela curiosidade, para ver como ficou. Muitos carros não respeitam os ciclistas, é arriscado mesmo", comentou. Alves diz que costumava utilizar a ciclovia e continuará a usar no futuro. "Acidentes acontecem. Apesar de o projeto ser malfeito, acho que vão consertar direito", diz o morador do centro.
O empresário italiano Eduardo Pozzi, de 28 anos, e a namorada, a professora Patricia Passos, de 36, chegaram de São Paulo, onde moram, na sexta-feira. O plano era percorrer de bicicleta a cidade, um programa frequente do casal. A Ciclovia Tim Maia estava no roteiro e, apesar do desabamento, eles decidiram manter a programação. No entanto, quando chegaram ao bloqueio na frente do Vidigal, decidiram voltar. "O trecho foi malfeito, mas não é toda a ciclovia que está condenada", afirmou Pozzi. Ele disse se sentir seguro em andar pela ciclovia na parte que não foi prejudicada.