Empresas de ônibus de São Paulo acreditam que redução de prazo de contratos para 15 anos não terá impactos em tarifas e subsídios

17/09/2019 08:00 - Diário do Transporte

ADAMO BAZANI

As empresas de ônibus que vão continuar prestando serviços na cidade de São Paulo, já que a licitação não teve a participação de companhias de fora do sistema, ainda analisam os impactos da redução do prazo de contrato de 20 anos para 15 anos, mas acreditam que a mudança não vai gerar a necessidade de ampliar os subsídios (que hoje estão em torno de R$ 3 bilhões por ano), a tarifa de remuneração (o quanto as viações recebem a cada passageiro transportado) e a tarifa pública (o quanto o passageiro paga nas catracas).

Em entrevista para o Diário do Transporte, o presidente do sindicato das empresas de ônibus, SPUrbanuss, Francisco Christovam, diz que a aposta para compensar a manutenção dos mesmos investimentos previstos para 20 anos agora no prazo de 15 anos é a redução de custos operacionais, com medidas como racionalização das linhas, evitando sobreposições.

“Não haverá grandes impactos econômicos-finaceiros. Alguma coisa sim, mas não suficiente para gerar valores que vão impactar significativamente a tarifa de remuneração das empresas ou o subsídio. Eu acho que as racionalizações ou otimizações que deverão acontecer, certamente serão muito maiores do que o eventual aumento [de custo] provocado por essa redução do tempo de contrato. Nós estamos apostando que a implantação da nova rede, do novo sistema de monitoramento e gestão e a modernização dos terminais vão reduzir o custo de operação de tal forma que a eventual redução de tempo de contrato possa ser absorvido, mas isso nós ainda estamos avaliando” – disse.

O representante das empresas vê como positivas as mudanças no sistema e afirmou que a redução de frota e linhas não será prejudicial à população. Segundo Christovam, o total de vias atendidas pelos ônibus vai aumentar dos atuais 4,5 mil km para 5,1 mil km e haverá mais oferta de lugares porque veículos menores vão ser substituídos por maiores. As empresas esperam que essas mudanças sejam gradativas.

Os passageiros, entretanto, terão de fazer mais baldeações em alguns casos.

Com medidas como a redução dos embarques integrados possíveis pelo Vale-Transporte (comprado pelos empregadores) de quatro para dois por sentido de viagem, o aumento no número de baldeações pode ser uma preocupação para muita gente, principalmente para quem mora mais longe e deve ser o passageiro que fará mais trocas de ônibus para completar a mesma viagem de todos os dias. A medida foi uma das alternativas da prefeitura para reduzir as necessidades de subsídios.

Na lógica da gestão Bruno Covas, estas integrações são de responsabilidade do empregador e não seria justo que os cofres públicos bancassem este custo que, ainda segundo a prefeitura, pode chegar a R$ 650 milhões por ano.

Depois de uma longa batalha judicial, que ainda pode ter novos capítulos, além de limitar os embarques com o Vale Transporte, a tarifa da modalidade subiu de R$ 4,30 para R$ 4,57.

A modalidade comum do Bilhete Único não teve mudanças.

No dia 06 de setembro de 2019, em meio a uma greve de motoristas e cobradores de ônibus, o prefeito Bruno Covas e o secretário de mobilidade e Transportes, Edson Caram, anunciaram a assinatura dos contratos com as viações.

O prazo foi reduzido para 15 anos depois de duas decisões do TJSP – Tribunal de Justiça de São Paulo que considerou inconstitucional a lei que previa os 20 anos de contrato e que baseava a licitação, pelo fato de ter sido elaborada pelo legislativo (vereadores). Os juízes entenderam que esta atribuição é do executivo (prefeitura). Com a decisão de considerar inconstitucional a lei de 20 anos, voltou a valer a lei anterior, de 2001, que previa prazo de até 15 anos.

Segundo Christovam, apesar da manutenção dos mesmos valores de investimentos previstos em 20 anos nos contratos de 15 anos, em alguns casos, na prática, haverá reduções naturalmente de investimentos.

“É um fluxo de caixa que tem todo o investimento diluído no prazo de vigência do contrato, onde há os custos operacionais. Vai exigir um estudo mais detalhado. É obvio que quando reduz o prazo você tem menos tempo para investir, mas num contrato de 20 anos, eu teria duas renovações de frota, e com 15 anos, uma vez e meia. Eu estou reduzindo a quantidade de investimentos que eu vou fazer.”- exemplificou.

Como mostrou o Diário do Transporte no dia do anúncio da assinatura dos contratos, a TIR – Taxa Interna de Retorno das empresas, que embute o lucro dos empresários no modelo da planilha de São Paulo, foi reduzido de 9,85% para 9,1%.

O representante das viações disse que não haverá diminuição da remuneração diária pelos serviços prestados, mas os resultados financeiros ao final da concessão serão menores.

“A taxa interna de retorno se aplica aos investimentos. Então, quando eu faço um investimento, eu tenho a necessidade de ter um ganho sobre ele. Senão, era melhor eu pegar este montante e aplicar numa poupança ou num fundo qualquer e eu teria mais vantagens do que se eu investir em melhoria na qualidade do serviço, por exemplo. No caso de São Paulo, a taxa interna de retorno envolve o lucro das empresas também. Quando tem essa mudança de 9,85% para 9,1% significa mexer não na remuneração diária, mas no lucro final ao término do contrato depois de 15 anos. Quando eu amortizei todos os investimentos e paguei todos os custos operacionais, eu vou ter um ganho, um resultado financeiro menor do que aquele que eu teria se o contrato fosse de 20 anos” – explicou.

Como mostrou o Diário do Transporte, a SPTrans revelou que a mudança de 20 anos para 15 anos nos contratos fará com que os valores caiam de R$ 71,14 bilhões para R$ 63 bilhões.

Francisco Christovam defende que, para manter o sistema e garantir os subsídios para gratuidades e integrações, sejam criadas fontes de recursos externos às tarifas. Uma das propostas é a taxação sobre os serviços de aplicativos como o Uber.

“Não há como discutir redução de tarifa e redução de subsídio se nós não começarmos a pensar em trazer novas formas de custeio do transporte. E aí tem alternativas como taxar o combustível do automóvel particular, cobrar taxa de funcionamento destes aplicativos de transportes. Enfim, criar novas fontes de receita para poder custear o transporte”  – disse.

Francisco Christovam disse que as empresas de ônibus de São Paulo devem considerar a possibilidade de prestarem serviços de transporte coletivo sob demanda por aplicativo, como já faz a HP Transportes, em Goiânia, com o City Bus 2.0, e o Grupo ABC, de São Bernardo do Campo, que ainda deve implantar comercialmente o modelo comercialmente na região chamado Ubus. Pelo sistema, vans e até mesmo ônibus de alto padrão atendem passageiros por aplicativo, com horários e itinerários sendo criados conforme a demanda.

“Nós temos uma expectativa bastante grande. Acho que o contrato [de São Paulo] não ficou com o escopo tão flexível como eu gostaria que tivesse ficado, mas dentro dessa linha de transporte complementar, talvez seja possível, em comum acordo com o poder concedente, as empresas proporem outro serviços, seja o transporte sob demanda, seja outros tipos de transporte que venham ao encontro da necessidade da população para que continue sendo fiel ao transporte coletivo e que de fato deixe de usar o transporte individual que congestiona cada vez mais o nosso sistema viário e dificulta cada vez mais a circulação dos ônibus. Esta linha deve ser devidamente explorada, mas tudo dentro da legalidade e do escopo do contrato” disse.

Outro assunto que precisa ser debatido é a inclusão de ônibus menos poluentes na cidade.

De acordo com a lei 16.802, promulgada pelo então prefeito de São Paulo, João Doria, em 17 de janeiro de 2018, em 10 anos, as reduções de CO2 (gás carbônico) pelos ônibus e caminhões de lixo devem ser de 50% e de 100% em 20 anos. Já as reduções de MP (materiais particulados) devem ser de 90% em 10 anos e de 95% em 20 anos. As emissões de Óxidos de Nitrogênio devem ser de 80% em 10 anos e de 95% em 20 anos. Os prazos são contados a partir de 2018, ou seja, já há quase dois anos de defasagem.

A lei está em vigor e independe dos novos contratos.  Entretanto, os contratos assinados não preveem apenas reduções em 2028 e 2038 como a lei, mas de ano a ano.

Como mostrou nesta segunda-feira o Diário do Transporte, a SPTrans disse que “as metas de redução de poluição não mudam com o prazo de 15 anos e são as mesmas previstas contratualmente.”

Assim, as empresas precisam ajustar os investimentos do ponto de vista financeiro para os 15 anos em vez de 20 anos.

Na última sexta-feira, 13 de setembro de 2019, técnicos da SPTrans – São Paulo Transporte, gerenciadora do sistema, e do SPUrbanuss, sindicato das viações, estiveram reunidos para debater a questão.

Há preocupações quanto à disponibilidade de modelos menos poluentes no mercado e o desempenho destes veículos para a realidade operacional em São Paulo.

A Transwolff, empresa do subsistema local que surgiu da cooperativa Cooper Pam e não é filiada ao SPUrbanuss, testa três ônibus elétricos com bateria, e até o final deste ano, deve ter 15 em circulação.

As fabricantes de ônibus que não rodam exclusivamente com óleo diesel e que estão instaladas no Brasil são:

– BYD (Campinas, SP): ônibus 100% elétricos com bateria

– Eletra (São Bernardo do Campo, SP): ônibus 100% elétricos com bateria, ônibus híbridos (com dois motores, um elétrico e outro a combustão), ônibus dual (duas tecnologias de tração elétrica no mesmo veículo) e trólebus.

– Scania (São Bernardo do Campo, SP): ônibus a gás natural, detendo também a tecnologia a etanol.

– Volvo (Curitiba, PR): ônibus híbridos (com dois motores, um elétrico e outro a combustão) com atendimento para pedidos com frota maior.

Francisco Christovam também falou que, conforme preveem os contratos, as empresas de ônibus se preparam para criar sistemas de compliance, para transparência nas relações com a sociedade e setores públicos e privados, além de adoção de formas mais modernas de gestão.

Veja a entrevista na íntegra:

Diário do Transporte: Como as empresas recebem essas mudanças nos contratos e quais as principais dúvidas?

Francisco Christovam: Existe um processo licitatório, onde as regras que o poder concedente tem de implantar pra melhorar a qualidade do serviço prestado à população estavam lá todas estabelecidas.

Se as nossas associadas, as antigas concessionárias e permissionárias leram o edital e apresentaram suas respectivas propostas, é porque elas se julgaram em condições de cumprir com as exigências e atender aquilo que o poder concedente especificou como necessidade pra que de fato possa melhorar o serviço prestado à população.

Eu começaria com aquilo que eu denomino “projeto básico” da licitação, que foi o estudo de uma nova rede de transporte para a cidade de São Paulo. Essa rede que está em operação é uma rede desatualizada, foi concebida no começo dos anos 2000, serviu como base para a licitação feita no governo da prefeita Marta Suplicy e que culminou nos contratos que nós vínhamos trabalhando, mas que se esgotou em termos de racionalidade, funcionalidade e possibilidade de prestar serviço de melhor qualidade.

A SPTrans fez um estudo de uma nova rede de transporte, aumentando inclusive as possibilidades de atendimento à população em número de lugares oferecidos. Aproveito até pra esclarecer, porque às vezes dá confusão, todo mundo fica muito preocupado com a redução no número de veículos. Isso é um engano. Na verdade, veículos de pequeno porte estão sendo substituídos por veículos de grande porte.

O que precisa ser analisado é a quantidade de lugares que serão oferecidos à população nessa nova rede, que terá uma abrangência maior. Para você ter uma ideia, vamos passar de 4.500 km de vias por onde circulam os ônibus para mais de 5.100 km, o número de linhas será reduzido, mas muito em função da desatualização da rede, porque ao longo do tempo foi sendo criada sobreposição de linhas, houve a criação de algumas linhas de metrô, isso é bem típico no eixo da avenida Ibirapuera, Santo Amaro, com a entrada da Linha 5. Necessita haver uma racionalização do sistema.

Temos que implantar uma nova rede e queremos tirar vantagem dos estudos que foram feitos. Essa é uma questão extremamente importante.

Outra questão que está colocada no edital, consequentemente no contrato, é a necessidade de se criar um fundo de investimento e participações, onde todas as empresas concessionárias serão cotistas e deverão aportar em torno de R$ 180 milhões para que possa ser implantado na cidade de São Paulo não só melhorias nos 30 terminais de transferência como também no sistema de monitoramento e gestão operacional.

Diário do Transporte: Esse valor muda com a redução do tempo de contrato?

Francisco Christovam: Eu acho que não. Porque ele não estava atrelado ao valor do contrato final. É o resultado de uma avaliação que a SPTrans fez da necessidade de um sistema de monitoramento moderno, que inclui softwares sofisticados de acompanhamento, infraestrutura, tudo o que é necessário para que q cidade de São Paulo, que depende fundamentalmente do sistema de ônibus para que a população possa realizar o deslocamento, tenha um moderno sistema de monitoramento. Que a gente possa inclusive acompanhar em tempo real tudo o que está acontecendo em cada uma das linhas e fazer as alterações necessárias para que o serviço possa ser prestado. Por exemplo, tem um acidente que está interrompendo a circulação de uma determinada linha, a central de operações será capaz de encaminhar mensagens para os motoristas para que eles façam uma rota alternativa e continuem a operação. Não como acontece hoje, que a gente não tem esse acompanhamento em tempo real, nós não ficamos sabendo como orientar os motoristas para que eles operem em trajetos alternativos.

Essa questão é extremamente relevante, que é a implantação de um moderno sistema de monitoramento. Isso, de acordo com as regras do edital, significa um aporte de mais de R$ 170 milhões a ser feito pelas empresas concessionárias. É uma obrigação que nós assumimos quando assinamos esse contrato.

Por outro lado, há uma exigência relevante, que é que todas as empresas tenham um sistema de conformidade, ou compliance. São manuais de conduta, de ética, que deverão disciplinar a relação que o poder concedente terá com as empresas concessionárias. Isso tem a ver com a necessidade de se implantar sistemas modernos de governança em todas as empresas, que tradicionalmente vêm se modernizando, mas nunca tiveram uma obrigação. Agora elas serão forçadas a se modernizar, adotar modernos sistemas de gestão empresarial para poder atender a essa exigência do contrato.

Outro item relevante é que a substituição dos veículos que estão vencendo a vida útil seja feita por veículos cada vez menos poluentes, que possam atender a legislação ambiental, que é extremamente rigorosa e já estabelecia alguns parâmetros para reduções de emissão de óxido de nitrogênio, gás carbônico e de material particulado nos próximos 20 anos.

Para se ter uma ideia, a lei extrapola a vigência desse contrato. Nós estamos imbuídos de adotar medidas necessárias para que a gente possa de fato cumprir com isso. É uma obrigação que a gente assume também a partir de agora e inclusive tivemos uma reunião no SPUrbanuss, discutindo com os técnicos da SPTrans as formas de acompanhar esse processo, para que a gente possa atender às exigências.

Diário do Transporte: Se vai ter que trocar em 15 anos. Não vai acelerar esse processo?

Na verdade, os impactos todos dessa redução de prazo de 20 anos para 15, ainda estamos analisando. Isso não é uma conta muito simples de se fazer. Tem um impacto econômico, financeiro, que tem que amortizar os investimentos e depreciar os veículos em um prazo mais curto, mas tem questões de adequar agora o cronograma de renovação da frota a esse novo prazo de vigência do contrato. Não vejo grandes problemas, mas a gente tem que avaliar os impactos disso. Ainda estamos nesse processo.

Diário do Transporte: Com isso a tarifa técnica pode aumentar?

Não é tão simples assim quando se trata de aplicar isso em um fluxo de caixa que tem todo um investimento diluído nesse prazo de vigência do contrato, custos operacionais, etc. Exige um estudo mais detalhado. Óbvio que quando se reduz o prazo, estou reduzindo a quantidade de investimento que eu vou fazer, mas não é tão simples assim a gente analisar isso. Eu acho que não haverá grandes impactos financeiros. Alguma coisa sim, mas não o suficiente para gerar valores que vão impactar significativamente a tarifa de remuneração das empresas ou subsídio. Acho que as otimizações que deverão acontecer certamente serão muito maiores do que o eventual aumento provocado por essa redução da vigência do contrato.

Nós estamos apostando que a implantação da nova rede, do novo sistema de monitoramento e gestão, modernização dos terminais, tudo isso vai reduzir o custo de operação de tal forma que a eventual redução do prazo do contrato possa ser absorvida, mas ainda estamos avaliando.

Diário do Transporte: A Taxa Interna de Retorno era de 9,85% e foi para 9,1%. O que significa essa redução?

Francisco Christovam: No caso de São Paulo, a Taxa Interna de Retorno se aplica aos investimentos. Quando faço um investimento, tenho a necessidade de ter um ganho. Senão, eu pegaria esse montante e aplicaria em um fundo qualquer, tendo mais vantagens do que se eu investisse em melhoria na qualidade do serviço, por exemplo. Em São Paulo, a taxa envolve sim o lucro das empresas e quando há essa redução, isso significa mexer no lucro final, ao término do contrato, depois de 15 anos, quando amortizei os investimentos e custos operacionais, vou ter um ganho menor do que o que eu teria se o contrato tivesse 20 anos.

Diário do Transporte: Os empresários vão lucrar menos?

Francisco Christovam: No geral. Isso não diminuiu remuneração pela prestação do serviço, mas na hora que se analisa o fluxo de caixa ao longo da vigência do contrato em 15 anos, vai reduzir o resultado financeiro, que embute lucros e ganhos eventuais, que as empresas obterão se tivesse operando em 20 anos.

Diário do Transporte: Como fazer as contas fecharem?

Francisco Christovam: O que nos deixa em condições de cumprir o contrato é que, de acordo com o próprio contrato, a cada quatro anos haverá um estudo do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos. Qualquer alteração que aconteça para mais ou para menos, no período de quatro anos, com um estudo técnico por empresas de auditoria, os contratos são reequilibrados.

Então, isso nos dá uma certa tranquilidade para poder trabalhar, cumprir com as obrigações, enfrentar a redução de taxa de retorno, do prazo do contrato, porque daqui há quatro anos, teremos um estudo de reequilíbrio econômico-financeiro. Se houve qualquer ganho maior, isso será compensado. Se houver menor, da mesma forma o poder concedente terá que recompensar essa perda de ganho ao longo do período.

Diário do Transporte: Esse contrato pode resolver problemas de pagamento de subsídios?

Francisco Christovam: Subsídio é para os passageiros e não para as empresas. Isso não é jogo de palavras. Quem recebe o subsídio da Prefeitura são os idosos, que antes só poderiam usar o ônibus sem pagar após os 65 anos e na administração passada tiveram uma redução de 5 anos, bastando ter 60 anos para andar de graça nos ônibus. Isso tem um custo. Também na administração passada houve uma decisão política de isentar os alunos de baixa renda do pagamento. Tem ainda um programa de integração, que como instrumento de planejamento de transporte é extremamente interessante, mas tem um custo, que é o cidadão poder, apenas com o pagamento de uma passagem, em um período de três horas, fazer até quatro transferências.

Para o cidadão, ele está pagando uma passagem só, mas para o poder concedente, cada vez que o passageiro entra em um ônibus novo, ele está custando uma passagem. Foi isso o que aconteceu na história do sistema de remuneração de São Paulo e que levou a esse montante de mais de R$ 3 bilhões que são necessários para cobrir o custo do transporte.

Hoje, produzir transporte por ônibus na cidade de São Paulo custa R$ 8,2 bilhões anualmente. A gente consegue arrecadar com o pagamento das tarifas R$ 5,5 bilhões e ainda fica faltando R$ 3 bilhões, mas insisto, isso não é dinheiro que vem subsidiar as empresas. A prefeitura é que está pagando para o idoso e o estudante de baixa renda utilizarem o sistema de transporte sem ter que pagar, as integrações gratuitas, assim por diante.

Quando se tem uma rede racionalizada, você está tendo possibilidade de produzir um serviço a um custo mais reduzido. Difícil saber ainda o impacto dessa nova rede que foi estudada para a cidade de São Paulo, não dá para fazer uma estimativa agora. Com a implantação gradativa da nova rede, vamos tendo ganhos que certamente poderão reduzir o custo da prestação de serviços, mas essa decisão dos subsídios é política. Depende das autoridades dizerem que vão voltar, por exemplo, a questão do idoso para 65 anos, porque é isso que estabelece a Constituição. De repente reduzir ‘uma perna’ das integrações. Já houve uma tentativa dessa. Enfim, não há como discutir redução de tarifa ou de subsídio se não começarmos a pensar, e essa responsabilidade é muito mais do poder concedente do que nossa, em trazer novas formas de custeio no transporte. É você taxar o combustível do transporte individual, o funcionamento do transporte por aplicativo, criar novas fontes de receita para poder custear o transporte.

Diário do Transporte: Os serviços complementares das empresas de ônibus também não podem ser essa receita extra?

Francisco Christovam: Nós temos uma expectativa bastante grande, eu acho que o contrato não ficou com um escopo tão flexível como eu gostaria que tivesse ficado, mas dentro dessa linha de transporte complementar, talvez seja possível, de comum acordo com o poder concedente, as empresas proporem outros serviços, seja o transporte sob demanda ou outros tipos de transporte que venham ao encontro da necessidade da população, que a população continue sendo fiel ao transporte coletivo e de fato deixe de usar o transporte individual que congestiona cada vez mais nosso sistema viário e dificulta cada vez mais a circulação dos ônibus, enfim, essa linha precisa ser devidamente explorada, tudo dentro da legalidade, do entendimento daquilo que é o objeto do contrato. Nós não imaginamos poder fazer nada que não seja devidamente aprovado, acompanhado e fiscalizado pelo poder concedente, mas precisamos ter flexibilidade, senão nós vamos assistir muito brevemente a instauração do verdadeiro caos na cidade, porque esses transportes por aplicativo vêm facilitando cada vez mais o transporte individual, seja por automóvel, por patinete por bicicleta, por moto. Uma empresa colombiana conseguiu autorização para operar mototáxi aqui em São Paulo, mas eles conseguiram quebrar essa proibição. Nós vamos ter mototáxi por aplicativo.

Pode colocar aí em seu radar que você vai ver como vai crescer a quantidade de acidentes na cidade de São Paulo, porque qualquer pessoa pode se cadastrar nesse aplicativo e começar a transportar passageiro no sistema de mototáxi, que até então a gente não tinha aqui em São Paulo.

Isso é mais uma questão que entra em São Paulo para congestionar e bagunçar mais a chamada matriz de transporte. Nós temos o transporte público, coletivo, esse sim precisa ser incentivado, estimulado. É de responsabilidade da Prefeitura e do Estado oferecer sistemas coletivos de transporte e não individual.

Para que a gente tenha o mínimo de qualidade, precisamos ter infraestrutura adequada e condições de circular nossos ônibus com alguma exclusividade no sistema viário.

Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes