Na agenda ESG, modal rodoviário se volta para veículos elétricos

15/06/2022 09:30 - Valor Econômico

Por Suzana Liskauskas — Para o Prática ESG, do Rio

Diante da crescente preocupação com o aquecimento global e da pressão da sociedade pela busca de energia limpa, várias empresas que atuam no segmento de transporte ou que têm a logística no coração dos negócios estão investindo na eletrificação da frota. A DHL Supply Chain no Brasil é uma delas. Para zerar as emissões de gás carbônico (CO2) em suas operações até 2050, a empresa vai dobrar a frota atual de 70 veículos elétricos em 12 meses, sendo 80% composta por VUC (Veículo Urbano de Carga) e caminhões. Para dimensionar a mudança, a empresa estima que 70 veículos elétricos conseguem evitar a emissão de 22 mil toneladas de CO2 nos próximos 30 anos, análise feita com base na metodologia global Well-to-Wheel aplicada para comparar transmissões de veículos.

Fábio Miquelin, vice-presidente de Transportes da DHL Supply Chain, diz que a frota elétrica atende hoje oito clientes no Sul e Sudeste nos setores de comércio eletrônico, farmacêutico, moda e consumo. “Até o fim de 2022, nossos veículos elétricos vão circular também na Bahia, Ceará e Pernambuco. Estamos concentrados na distribuição urbana, em rotas curtas por conta da limitação da infraestrutura de abastecimento de carga”, diz Miquelin. Segundo ele, outra meta da empresa é a utilização de energia limpa nos pontos de reabastecimento dos veículos elétricos. “Vamos iniciar a instalação de painéis solares nesses pontos em 2023. Hoje, nosso Centro de Distribuição, em Louveira (SP), já produz sua própria energia a partir de fonte solar.”

A empresa não detalha o investimento no país para a eletrificação da frota, mas Miquelin diz que os valores estão incluídos no montante destinado à América Latina para a Estratégia 2025, de 30 milhões de euros.

Um dos clientes da DHL Supply Chain que já utiliza vans e VUC elétricos para entregas em lojas de rua e shopping centers é o grupo Boticário, cuja meta é realizar todas as entregas com veículos elétricos até 2025 nas capitais brasileiras. Com autonomia em torno de 200 quilômetros, o VUC elétrico vem sendo utilizado para entregas urbanas do trecho conhecido na logística como ‘última milha’. Parte da frota da DHL conta com o modelo JAC iEV1200T, com capacidade de 7,5 toneladas.

A eletrificação de caminhões considerados leves também é uma grande aposta da Volkswagen Caminhões e Ônibus no Brasil (VWCO). Desde o início da produção, em junho de 2021, a fábrica em Resende (RJ) já vendeu 300 unidades dos modelos de caminhões elétricos e-Delivery, nas versões 11 e 14 toneladas. Entre os compradores do modelo estão Ambev, JBS e Coca-Cola FEMSA Brasil. Para desenvolver e produzir o e-Delivery, a VWCO investiu cerca de R$ 150 milhões. Até o fim de 2022, sua produção de caminhões elétricos vai escoar também para a América Latina. Segundo a montadora, o processo está em testes de altitude e homologações. “Estamos aumentando a produção aos poucos no Brasil, mas já analisamos as exportações. A entrega das primeiras unidades está prevista até o fim do ano, com foco no México e na Argentina”, diz Roberto Cortes, CEO da VWCO.

Segundo Cortes, os caminhões elétricos custam cerca de R$ 850 mil, enquanto o modelo tradicional de mesmo porte fica em torno de R$ 300 mil. “Mas o custo de manutenção cai para metade, considerando um veículo que roda 24 horas. O investimento do caminhão se paga em cinco anos”, diz.

Na análise de Cortes, o mais viável, no caso do Brasil, para reduzir as emissões no modal rodoviário é a eletrificação da frota de caminhões voltados para a distribuição urbana, por não exigir muito infraestrutura de carregamento. Segundo ele, entre 10% e 15% da frota produzida no Brasil será concentrada neste tipo de modelo.

“Estamos trabalhando em projetos de ônibus elétrico, mas vai demorar mais. Em média e longa distância, para haver uma produção em escala de caminhões elétricos, será preciso investir em infraestrutura de carregamento. É uma questão de prioridade, e a do Brasil é diferente de Suécia, Alemanha e EUA”, diz Cortes.

A Americanas S.A. é outra com plano de descarbonização. “A eletrificação da frota é uma das principais iniciativas para redução das emissões, estratégia para a companhia se tornar carbono neutro até 2025”, diz Patricia Bello, gerente de operações de logística da varejista.

A Americanas começou a montar sua frota de utilitários elétricos para rotas de até 200 km, em 2021. Hoje, a empresa tem 180 veículos rodando em nove estados, no Sudeste, Sul, Nordeste e, Distrito Federal. A frota para a “última milha” também inclui 61 tuk-tuks elétricos e 86 bicicletas (convencionais e elétricas). Com a eletrificação, a empresa reduziu em 90% os gastos mensais para manutenção da frota para distâncias mais curtas. Mas a empresa paga pelo consumo de energia elétrica, que varia de acordo com as regiões do país.

“A maioria dos veículos que operam a nossa logística ainda é tradicionalmente movida a combustão, mas estamos melhorando esse patamar em diversas modalidades”, afirma Bello, acrescentando que, em 2021, 14% das entregas na “última milha” foram feitas com frota ecoeficiente.

A eletrificação da frota também já chegou na indústria. A Vale está substituindo combustíveis fósseis por fontes limpas em minas e ferrovias. O projeto Powershift vai eletrificar essas duas áreas, que juntas respondem por 25% das emissões diretas de carbono da companhia.

Na operação de metais no Canadá, a Vale já tem 40 veículos elétricos de mina subterrânea. Agora, vai começar a testar caminhões elétricos de 72 toneladas fabricados pelo grupo chinês Xuzhou nas minas de minério de ferro de Água Limpa (MG) e na Indonésia. Como comparação, um caminhão convencional, deste porte, usado pela empresa emite 886 toneladas/ano de CO2.

A Vale ainda espera receber, em 2024, protótipos de caminhões 100% elétricos da Cartepillar, com capacidade entre 240 e 320 toneladas, para operar fora de estradas. Se o projeto avançar, pretende adquirir 30 desses caminhões a partir de 2027.

Na ferrovia, uma locomotiva elétrica já passou por testes na Estrada de Ferro Vitória a Minas e no pátio de manobra. O equipamento está passando por retrofit e começará a operar na linha no segundo semestre, compondo, com outras locomotivas a diesel, o primeiro trem híbrido do país. Uma segunda locomotiva 100% elétrica entrou nos trilhos em abril no pátio de manobra do Porto Ponta de Madeira, em São Luís (MA), em caráter piloto. Quando estiver em plena operação, vai rodar nas minas da Vale no Pará pela Estrada de Ferro Carajás. Por ano, uma locomotiva tradicional consome até 100 mil litros de diesel (254 ton de CO2).