Onda derruba ciclovia, mata dois e expõe falha em obra

22/04/2016 08:00 - O Globo

Inaugurada há pouco mais de três meses, ao custo de R$ 44,7 milhões, a Ciclovia Tim Maia, em São Conrado, foi cenário de uma tragédia ontem de manhã: por volta das 11h10m, quando o movimento era grande devido ao feriado, um trecho de 50 metros desabou ao ser atingido por uma forte onda, arrastando pelo menos duas pessoas, cujos corpos foram localizados perto da Praia de São Conrado. Bombeiros ainda procuram outras possíveis vítimas. Especialistas disseram que o projeto deveria ter previsto a ocorrência de ressacas. Eles suspeitam também que o tabuleiro da pista não estava adequadamente fixado aos pilares. O prefeito Eduardo Paes considerou o acidente “imperdoável” e determinou apuração do caso. O consórcio Contemat-Concrejato, responsável pela obra, informou que as razões da queda estão sendo avaliadas. No dia em que a tocha olímpica foi acesa na Grécia, a cidade que sediará os Jogos este ano viveu uma tragédia. Com o impacto das ondas, um trecho da Ciclovia Tim Maia, em São Conrado, inaugurada há apenas três meses, desabou, matando pelo menos duas pessoas. Para especialistas em estruturas, a obra não levou em conta o risco de ressacas.

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POR QUE UMA ESTRUTURA NA ORLA DESABA COM A FORÇA DE UMA ONDA?

Depois do choque e da constatação de que o improvável aconteceu, o carioca começou a se questionar. Como pode uma onda derrubar uma pista construída ao longo de um costão? Para especialistas consultados pelo GLOBO, houve falhas no projeto, fiscalizado pela Geo Rio, órgão da prefeitura. O consórcio responsável pela obra não contou com a força do oceano ao planejar e implantar as estruturas que sustentam a ciclovia.

Entretanto, não existe consenso entre eles na hora de apontar as falhas do projeto. Para o engenheiro civil Antônio Eulálio, especialista em pontes que é conselheiro do Crea-RJ, havia um erro justamente na viga que sustentava o trecho tombado: nela, os anteparos que sustentavam a pista estavam próximos demais um do outro. As outras vigas têm suportes para a ciclovia mais espaçados, o que aumenta a resistência.

— Para mim, não foi considerada a hipótese da onda atuando. Aí, a pista tombou. Ela não tinha segurança. A onda pegou, no balanço, a parte inferior da laje e fez a ponte girar — afirma Eulálio. — Depois de girar, a estrutura caiu no costão da Avenida Niemeyer.

Para Manoel Lapa, coordenador da Câmara de Engenharia Civil do Crea-RJ, uma estrutura de aço poderia ter reforçado a fixação da pista à viga. No jargão da engenharia, isso é chamado de ancoragem. É uma espécie de parafuso de aço gigante, que uniria as duas estruturas, prendendo-as. Lapa ressalta que nem as vigas nem o piso da ciclovia quebraram. O que falhou, portanto, foi a ligação entre elas.

— A pista precisaria segurar no pilar para que não soltasse. Não poderia estar simplesmente apoiada — diz ele. 

RISCO DE RESSACAS 

Segundo o engenheiro, em obras como a da ciclovia, é preciso levar em conta o risco de ressacas. Para isso, em geral, os responsáveis preparam a construção para resistir à maior onda registrada em 50 anos, a chamada “onda de projeto”.

— Se não foi levado em conta, houve uma falha grave — observa Lapa.

A hipótese é parecida com a levantada pelo oceanógrafo David Zee, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Para ele, a potência das ondas no local não foi calculada pelo consórcio que tocou a obra. Ele esteve no local do acidente e observou que não havia o reforço de ancoragem mencionado por Manoel Lapa, ligando os pilares ao corredor da ciclovia. A área onde a pista foi construída forma, segundo ele, uma espécie de funil, que potencializa a força do mar.

— As estruturas aqui não estão ancoradas, estão apenas apoiadas pelo próprio peso. Na hora que veio uma onda nessa direção específica, deu um tremendo soco de baixo pra cima, e o peso da própria plataforma não foi capaz de resistir. O pessoal de engenharia desenhou a estrutura muito bem, mas sem levar em conta a carga do mar — avalia Zee.

Os especialistas defendem a interdição da ciclovia para perícia, o que já foi anunciado pela prefeitura.O Crea-RJ vai apurar se houve erro dos técnicos responsáveis pela obra. Todos serão ouvidos pela Comissão de Análise e Prevenção de acidentes da entidade. Eles podem ser punidos com uma advertência ou até com a cassação do registro profissional.

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POR QUE A PREFEITURA NÃO INTERDITOU A CICLOVIA DURANTE A RESSACA?

Ao mesmo tempo em que apontam falhas na fiscalização da obra, especialistas afirmam que as autoridades deveriam providenciar mais segurança para o tráfego de ciclistas nas áreas com perigo de ondas gigantes. Sem um alerta, os usuários da ciclovia ficam expostos ao risco. Dois homens foram encontrados mortos e bombeiros continuarão procurando hoje outras possíveis vítimas: há informações de que pelo menos uma terceira pessoa caiu no mar.

David Zee, professor da Uerj, alerta que havia uma confluência de fatores que apontavam para o risco. Estamos em fase de lua cheia, na qual a amplitude das marés aumenta. A maré baixa, nesta época, fica com um nível ainda menor. A mais alta, por sua vez, sobe acima da média. Por volta das 11h, quando ocorreu o acidente, a cheia atingiu o seu ápice, com ondas de mais de 2,5 metros.

— À medida que o risco começa a crescer, você pode adotar uma medida de contingência, de interditar a passagem. Esse coeficiente de segurança a gente não pode aumentar demais, porque cria uma estrutura impraticável — diz o oceanógrafo, alertando que, por mais forte e bem calculada que possa ser a ciclovia, é preciso limitar a circulação de pessoas quando o mar ameaça alcançar a pista.

Segundo Zee, os engenheiros responsáveis pela obra precisam levar em conta que o mundo atravessa um processo de mudanças climáticas, que tornam possíveis cenários improváveis.

Para José Eugênio Leal, professor de Engenharia de Transportes da PUC-RJ, a ciclovia deveria ter um sistema de prevenção:

— Qualquer obra dessas precisa ter segurança, um sistema de prevenção. Se está com ondas muito altas, ninguém pode trafegar. Havendo uma situação dessas, o ideal é que a ciclovia seja fechada (a ciclovia só foi interditada quase duas horas após o acidente).

Manoel Lapa, do Crea-RJ, observa que o local onde houve o acidente poderia ter guarda-vidas para alertar ciclistas e pedestres em caso de ressaca.

— Aquele é o local onde as ondas vão subir mais:

A Marinha confirmou ontem que havia ressaca no momento do desabamento. Já o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (Cptec/Inpe) destacou que o mar ficou agitado devido a um ciclone que se formou no Sul do país há dois dias e passou longe da costa. Não foi a primeira ressaca registrada desde a inauguração da ciclovia, diz o Inpe.

INAUGURAÇÃO COM FESTA HÁ 3 MESES

O primeiro trecho da Ciclovia Tim Maia, na Avenida Niemeyer, foi inaugurado com pompa e circunstância em 17 de janeiro deste ano. Com 3,9km de extensão e aproximadamente 2,5 metros de largura, a pista que liga o Leblon a São Conrado foi construída sobre o costão de pedra, com vista para o mar. A obra demorou um ano e meio para ficar pronta e consumiu R$ 44,7 milhões. Com a novidade, os ciclistas passaram a ter 39,8km de pistas exclusivas na orla. No dia da inauguração, houve até engarrafamento de ciclistas. Posteriormente, o risco de assaltos foi apontado por usuários, que se preocupavam com a falta de saídas.

Relatos de quem se salvou por um triz

Ciclistas e pedestres que estavam na pista na hora da queda contam como foi escapar do acidente

“Por 20 segundos não caí também. Vieram três ondas, uma série muito grande. Quando uma delas bateu, desceu levando a ciclovia. Deu para ver três pessoas, uma de bicicleta, caindo. Depois, vi os corpos boiando” Guilherme Miranda Administrador “Eu estava há 15 minutos em cima da ciclovia, o dia estava muito bonito. Como é que fazem uma obra desse tipo, com total irresponsabilidade? Não tem engenheiro? Não tem cálculo estrutural? É uma bagunça, uma loucura” Cléber Pereira Economista “Estava olhando as ondas fortes e, de repente, um ônibus foi surpreendido pela água, que o cobriu. Em seguida, a ciclovia desceu. Se fosse um carro, seria jogado contra a parede. Uma turma que estava na pista foi empurrada pela água” Valdemir Diniz Empresário

Uma mistura de sensação de alívio com a certeza de que tiveram muita sorte. Movidas por sentimentos que nem elas sabiam ao certo explicar, pessoas que presenciaram o desmoronamento de parte da Ciclovia Tim Maia, na manhã de ontem, contaram como foi o impacto de assistir à tragédia num dia que poderia ter sido marcado apenas pela contemplação de uma das vistas mais bonitas da cidade. O administrador Guilherme Miranda, que mora em São Conrado, testemunhou o momento exato da queda da pista. Ele estava andando de bicicleta e viu três pessoas caindo no mar:

— Por 20 segundos não caí também. Vieram três ondas, uma série muito grande. Quando uma delas bateu e molhou o asfalto, desceu levando a ciclovia. Deu para ver três pessoas, uma de bicicleta, caindo. Depois, vi os corpos boiando. 

ASSALTOS AFASTARAM A POPULAÇÃO 

Quando a ciclovia foi inaugurada, em janeiro, Guilherme ficou animado com a nova opção de lazer. Agora, ele afirma que se sentirá inseguro para passar novamente pela pista. O administrador lembra que a falta de policiamento na área já havia afastado muitas pessoas do local, devido ao medo de assaltos.

— Será um choque tremendo para São Conrado. Passo aqui todo dia. Estávamos muito felizes, porque finalmente o governo conseguiu inaugurar uma obra que deixou o povo satisfeito. Sentimos uma revitalizada no bairro, estávamos muito otimistas com essa ciclovia. Agora, não sabemos o que fazer. Foram quase R$ 45 milhões para uma obra inaugurada há quatro meses — disse o administrador. — Se obra tivesse sido bem feita, seria a melhor coisa para o bairro. Mas, logo depois, vieram os assaltos. Os carros de polícia e guardas municipais que passavam por aqui, eu já não os vejo mais. Voltou a ser perigoso de novo. Agora, cai a pista. Não vou mais me sentir seguro com esse governo, com essas obras.

A dona de casa Carina Viana, moradora da Rocinha, estava caminhando e presenciou o acidente, que deixou pelo menos dois mortos. Ela viu quando as ondas começaram a bater na ciclovia e, para não se molhar, parou. Chegou a alertar para o perigo quem passava pela pista, por volta das 11h10m. Na sequência, viu parte do asfalto ruir:

— Tive muita sorte mesmo. Eu, meu marido e meu filho saímos cedo para passear pela primeira vez na ciclovia. Já estávamos voltando quando as ondas começaram a bater com força. Eles estavam de bicicleta, seguiram na minha frente para São Conrado. Eu estava caminhando, fiquei para trás — contou Carina, acrescentando: — Vi as ondas molhando a ciclovia e fiquei receosa de passar, não queria me molhar. Ainda alertei dois homens que estavam de bicicleta, falei para eles pararem, mas eles passaram. Nessa sequência de ondas, a ciclovia tremia muito. Me segurei no corrimão e não vi mais nada. Quando olhei, dois minutos depois, já não tinha mais ciclovia. Nunca pensei que isso pudesse acontecer. Foi horrível. 

“PODERIA TER SIDO COMIGO”

A sensação do administrador Loris Schuchmann, que mora em Copacabana, foi de alívio na manhã de ontem. Ele passou pelo local momentos antes da queda. As ondas já tinham começado a bater forte:

— Tinha saído de Copacabana para ir a São Conrado e fui parando para ver as ondas que já estavam altas. Mas a ciclovia esta seca. Quando voltei, pouco antes das 11h, a água já estava atingindo a pista. Parei e fiquei olhando as ondas batendo no costão e percebi que a estrutura estava balançando. Muita gente estava aproveitando para se refrescar, até achei engraçado. Quando cheguei em casa e fiquei sabendo o que tinha acontecido, me deu uma sensação de alívio e vi que foi muita sorte.

Morador do Vidigal, o economista Gerson Pinto Magalhães passou pela ciclovia de bicicleta e disse que dava para sentir a trepidação no trecho que desabou:

— O mar estava muito agitado. Dava para sentir a ciclovia tremer com a pancada das ondas. Na hora fiquei até inseguro. Tinha um pessoal em cima da passarela. Muita gente estava andando a pé e de bicicleta. Paravam para tirar fotos na ciclovia. Depois que aconteceu o acidente, pensei: poderia ter sido comigo. No momento, fiquei até sem palavras.

O aposentado Damião Pinheiro de Araújo costuma pescar na região e conta que fazia tempo que o mar não ficava agitado:

— Tem um ano que o mar não sobe assim. É a natureza. A onda bateu, jogando a ciclovia para o alto. A água atingiu ainda um ônibus, quebrando os vidros dele. Quando a pista cedeu, as pessoas foram arrastadas para o mar. Vi quando caíram, todas estavam batendo fotos. Todo mundo saiu correndo apavorado. Fiquei assustado.

O músico Andre Rodrigues disse ter ficado chocado quando soube do acidente:

— Achei que o número de mortos poderia ser maior. Quando passei, por volta das 8h, tinha muita gente caminhando. Eu passei de bicicleta pela rua, porque não tinha espaço. Quando cheguei em casa, levei um susto.

José Américo Lopes passeava pela primeira vez na ciclovia e também notou que o mar agitado abalou a estrutura. Chegou até a registrar com fotos as ondas molhando as pistas:

— Passei 15 minutos antes da queda. Nunca poderia imaginar que isso aconteceria.

Prefeitura diz que vai cobrar explicações da construtora

Especialistas alertam para danos à imagem da cidade como organizadora dos Jogos

O prefeito Eduardo Paes, que embarcou anteontem para Atenas, na Grécia, onde foi realizada a cerimônia para acender a tocha olímpica, voltou ao Rio assim que soube do acidente. Em nota, ele disse que “é imperdoável o que aconteceu” e que determinou a apuração imediata dos fatos. Segundo Paes, o resultado da vistoria realizada pela Fundação Geo-Rio (órgão da prefeitura responsável pela fiscalização da ciclovia) será divulgado assim que for concluído.

Paes marcou uma reunião com técnicos da prefeitura para hoje, quando chega à cidade. Toda a ciclovia permanecerá interditada, sem previsão de reabertura. Segundo o prefeito, os reparos serão executados pelo consórcio responsável pela construção, sem ônus para o município.

Em nota, a presidente Dilma Rousseff disse que “foi com grande tristeza” que tomou conhecimento do acidente. “Expresso meu mais profundo pesar aos familiares e amigos das vítimas”, acrescentou. 

OBRA NO JOÁ VAI PARAR 

Quase duas horas depois do desabamento, o secretário executivo de Coordenação de Governo, Pedro Paulo Carvalho, chegou à Avenida Niemeyer. Ele reconheceu que o acidente é inadmissível, mas disse que prefere esperar a avaliação dos engenheiros da prefeitura antes de apontar possíveis causas:

— Faremos quantas avaliações forem necessárias para termos a absoluta segurança. Esse acidente é inadmissível e inaceitável. Mas não vamos trabalhar com especulações. É importante que nossas equipes possam fazer uma avaliação técnica para dizer o que realmente aconteceu. É prematuro para dizer. A prefeitura vai cobrar a responsabilidade de quem fez a obra, e só vamos liberar a ciclovia quando houver a absoluta segurança para o morador — afirmou Pedro Paulo. — A princípio, os cálculos que foram feitos seriam suficientes, dado ao histórico de ondas.

Pedro Paulo afirmou ainda que o segundo trecho da ciclovia Tim Maia, ao longo do Elevado do Joá, entre São Conrado e Barra, com previsão de inauguração até julho, passará por uma reavaliação. Segundo ele, a obra será paralisada. Já o consórcio Contemat-Concrejato, responsável pela obras da Niemeyer, informou que vai trabalhar até que sejam conhecidas as causas do acidente. Em nota, a empresa afirmou que segue todos os protocolos e normas de segurança. IMPACTO POLÍTICO O acidente de ontem deve abalar a imagem do Rio como cidade organizadora das Olimpíadas, já atingida pela crise econômica e pela epidemia de zika, e a de Pedro Paulo, précandidato do PMDB a prefeito do Rio, segundo especialistas.

Para o cientista político Antônio Flávio Testa, professor da Universidade de Brasília (UnB), a credibilidade do evento esportivo está afetada, assim como a imagem de Eduardo Paes, com a qual Pedro Paulo conta para ser eleito:

— Logo ele, que queria ter uma imagem de grande gestor.

O professor de ciência política Geraldo Tadeu Monteiro, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), acredita que o acidente será lembrado pela oposição ao governo:

— É claro que a imagem de gestor e de tocador de obras do Pedro Paulo pode ser comprometida.

O deputado estadual Luiz Paulo Corrêa da Rocha, do PSDB, faz coro:

— Esse acidente afeta as eleições, porque não é um fato isolado. É uma sucessão de fatos negativos.

Mídia internacional: capacidade do Rio é posta em dúvida

Reportagens sobre acidente na Niemeyer questionam segurança de obras olímpicas

A cobertura internacional do desabamento de parte da ciclovia Tim Maia, na Avenida Niemeyer, colocou em xeque a credibilidade do Rio de Janeiro como anfitrião dos Jogos Olímpicos. As reportagens também ressaltaram a atual crise política no país. O britânico “The Guardian" publicou em seu site que o acidente é um “grande golpe para o prestígio do Rio e levanta questões sobre os padrões de engenharia e de segurança do anfitrião". O jornal destacou ainda que a “ciclovia faz parte dos esforços da cidade para melhorar o transporte antes dos Jogos de 2016".

No texto, a publicação lembrou que faltam apenas cem dias para as competições e ressaltou a importância da ciclovia, que liga dois grandes polos esportivos da cidade: a Zona Sul — palco do remo e do triatlo —e a Barra, onde ficam o Parque Olímpico e a Vila dos Atletas. 

CRISE POLÍTICA EM DESTAQUE 

O site da “BBC” lembrou que a prefeitura do Rio se comprometeu a ligar todas as ciclovias costeiras da cidade antes das Olimpíadas. A publicação informou ainda que as obras da ciclovia começaram em 2014 e foram concluídas em janeiro deste ano. A reportagem reproduziu relatos sobre o acidente de pessoas que foram ouvidas pelo GLOBO.

Na imprensa americana, as crises política e econômica do país foram lembradas pelo “The New York Times": "O Rio será a primeira cidade sul-americana a sediar os Jogos Olímpicos, mas está lutando contra sua maior recessão em quase um século e uma crise política que podem levar ao impeachment da presidente".

O jornal ressaltou também que a ciclovia da Niemeyer faz parte do projeto da prefeitura de revitalização urbana, elaborado para receber as Olimpíadas, e lembrou que o desabamento aconteceu logo após a tocha olímpica ser acesa em Olímpia, na Grécia. Acrescentou ainda que o símbolo da competição chegará ao Rio no dia 3 de maio.

O jornal argentino “Clarín” relacionou a obra da ciclovia a "melhorias urbanas para os Jogos Olímpicos". A reportagem mostrou que as autoridades mobilizaram bombeiros, helicópteros e mergulhadores para buscar vítimas do acidente, provocado por uma onda forte, que deixou pelo menos dois mortos e um desaparecido.

‘A desgraça surgiu no caminho’

Cunhado de engenheiro morto diz que acidente na ciclovia é inadmissível

Os corpos das duas vítimas do acidente foram enrolados em cangas e estendidos nas areias da Praia de São Conrado. Um saco preto foi posto em cima deles logo em seguida, e a área, isolada. De repente, uma mulher de óculos escuros e calça jeans se aproxima e desaba em lágrimas. Mulher do engenheiro mecânico Eduardo Marinho de Albuquerque, a médica Eliane Fernandes soube da morte do marido enquanto seguia para o trabalho. Em estado de choque, correu em direção ao corpo e, chorando, desabafou: “Meu marido, deixa eu me despedir dele”. Os banhistas acompanharam a cena e se emocionaram com a trágica despedida. Depois, continuaram aproveitando, na praia, o feriado de Tiradentes.

Praticante de corrida, Eduardo percorria a ciclovia da Niemeyer desde a sua inauguração, em 17 de janeiro. Aos 54 anos, gostava de correr para relaxar, mantendo a saúde em dia. Ontem, calçou o tênis esportivo e saiu às 10h de casa, em Ipanema, na altura do Posto 9. Atravessou a Niemeyer e caiu no mar, quando a estrutura de concreto desabou com a forte onda. ‘O QUE ACONTECEU FOI ESPIRITUAL’ Irmão de Eliane e cunhado de Eduardo, João Ricardo Tinoco ia da Barra, onde mora, até o Arpoador, onde pretendia pegar ondas. No meio do caminho, na altura do Joá, recebeu uma ligação da irmã, que estava apreensiva.

— Ela me disse que estava com o coração apertado e pediu para ver se o Eduardo estava na Niemeyer — conta João Ricardo, que havia escutado sobre o acidente no rádio do carro.

Capitão-médico da Aeronáutica, foi ele quem reconheceu, primeiro, o corpo de Eduardo.

— O que aconteceu foi espiritual — disse, bastante emocionado, enquanto aguardava a liberação do corpo do cunhado na porta do Instituto Médico-Legal (IML).

Durante todo o tempo, João Ricardo deu apoio à irmã, que preferiu não conversar com a imprensa. Ele classificou o acidente como “inadmissível”.

— Não ficou boa a ciclovia. Se logo no início ela caiu, imagina se ficasse mais tempo. O trabalho final (da ciclovia) está aí, gerando desgraça para uma família. Era um dia de lazer, de sol, de contemplar a natureza, e a desgraça surgiu no caminho de quem só queria o bem. Eduardo era alto astral e adorava esportes. Era um carioca que gostava de viver a vida — comentou, acrescentando que evitava a nova ciclovia, não por causa de riscos na estrutura, mas pelo medo de assaltos.

O corpo de Eduardo será cremado hoje. Segundo parentes, antes de sair para correr, ele tinha deixado um bilhete para o filho de 15 anos: “Vou correr. Volto já. Te amo muito”.

Ontem à noite, o corpo da outra vítima, Ronaldo Severino da Silva, de 60 anos, foi identificado. Com a ajuda de lanchas e de um helicóptero, as buscas por outras possíveis vítimas foram encerradas às 18h. Os trabalhos serão retomados na manhã de hoje. A Polícia Civil abriu um inquérito para investigar as causas do acidente.