12/03/2021 06:45 - O Globo
RIO — A Prefeitura do Rio já começa a dar os primeiros passos para o processo de intervenção no BRT do Rio, que servirá como uma espécie de transição até que uma nova licitação seja concluída e o serviço seja assumido por uma nova empresa, que substituirá a gestora atual. No comando desta intervenção temporária estará Cláudia Antunes Secin, de 58 anos, ex-presidente da CET-Rio, hoje servidora da Secretaria municipal de Transportes, informação confirmada pelo consórcio BRT Rio. Ela é arquiteta, analista de sistemas e ingressou na Companhia de Engenharia de Tráfego do município em 1992, onde ocupou cargos de destaque.
Nos bastidores, já há movimentação para que a transição seja feita. Na última quarta-feira, por exemplo, um engenheiro de transportes da prefeitura já começou a trabalhar com o BRT e teve, inclusive, uma reunião com profissionais do consórcio. Nesta quinta-feira, ele já teve um novo encontro, desta vez especificamente com a equipe de planejamento do modal.
Entre mudanças imediatas que são estudadas e podem acabar sendo implementadas pela prefeitura no serviço tão problemático está uma possível volta da circulação 24h dos ônibus, que hoje rodam de 4h à meia-noite. Uma outra ideia exposta por Paes, ainda antes do anúncio da intervenção da prefeitura no sistema, previa a implementação do BRT rosa, que seria um carro só para mulheres — entre todos os problemas enfrentados, há ainda os casos de abuso sexual nos carros lotados, que não são raros.
O GLOBO procurou a prefeitura e a Secretaria Municipal de Transportes, que não se manifestaram.
'Eles tratam a população como gado'
A decisão de intervir no BRT foi tomada pelo prefeito Eduardo Paes no último dia 3 de março, um dia depois que a empresa demitiu cem funcionários, incluindo motoristas do sistema.
— Essa não é uma decisão permanente. É para licitar, e não para devolver depois, como fez o Crivella (com a intervenção). É um meio para depois licitarmos. Eles tratam a população como gado. Não é uma encampação. Não queremos uma CTC no BRT — explicou Paes na ocasião.
Hoje, a sociedade BRT Rio, formada em 2019 para gerir o transporte, é formada pelos consórcios Transcarioca (operação a partir da Barra da Tijuca e Jacarepaguá, na Zona Oeste); Santa Cruz (Campo Grande, Santa Cruz e outros bairros da Zona Oeste) e Internorte (bairros da Zona Norte).
Entre março de 2020 e fevereiro deste ano, a empresa alega que teve uma perda de receita de R$ 215 milhões. Os empresários afirmam que o BRT Rio, hoje, conta com um prejuízo de R$ 7 milhões ao mês. Isso, reconhece o consórcio, afeta diretamente o pagamento de fornecedores e salários de funcionários. A grave crise financeira enfrentada pelo transporte é justificada, principalmente, por conta da queda de arrecadação em função da pandemia — apesar de, no dia a dia, o cenário ser de estações e carros sempre cheios. Hoje, há dificuldades até nas negociações com a empresa que fornece combustível aos ônibus.
Atualmente, são 98 ônibus parados por problemas de manutenção e 26 estações fechadas por causa de vandalismo ou furtos de equipamentos. Além dessas, 20 do eixo da Cesário de Melo, no corredor Transoeste, estão desativadas há três anos, desde 2018, também por conta da violência e destruição do patrimônio público. Procurado, o BRT Rio afirmou que se esforça para prestar um serviço com mais conforto e segurança aos passageiros, e que foram reformadas ou recuperadas 43 estações nos últimos 14 meses.
Os problemas do BRT, no entanto, são bem anteriores à Covid-19. São históricos, desde sua inauguração, em junho de 2012. Estações depredadas, buracos nas vias, calotes nas passagens, concorrência com transporte clandestino e dívidas crescentes foram os ingredientes que apenas se somaram à pandemia.
Recentemente, há pouco menos de dois anos, o então prefeito Marcelo Crivella já havia decretado uma intervenção no sistema, mas em moldes diferentes. Em seu relatório final, o interventor Luiz Salomão escreveu sobre diagnósticos e soluções do sistema e, ao lembrar da falência de mais de dez empresas dos consórcios, destacou falhas administrativas, como multiplicação de custos sem enxugamento das estruturas das empresas. Por outro lado, Salomão não negou problemas citados por empresários, como valor considerado baixo da tarifa e perda de receita com calotes.