Criada em 2012, com o objetivo de estimular tanto o
transporte público como o transporte não motorizado (bicicletas), a Lei de
Mobilidade Urbana é considerada um avanço para especialistas no tema, mas com
limitações.
"A lei não resolve, em si, o problema. Ela coloca mais
recursos, acelera investimentos, mas o que vai resolver mesmo é a solução de
mobilidade que cada cidade vai adotar", diz o arquiteto e urbanista Jaime
Lerner, que foi prefeito de Curitiba três vezes e implementou o sistema de
transporte público do município –exportado para mais de 300 cidades no mundo.
Aos poucos, no entanto, a lei (que deu três anos para
municípios apresentarem seus planos de mobilidade) começa a surtir efeito no
cotidiano de quem mora nas grandes cidades brasileiras.
As faixas e corredores exclusivos de ônibus e as
ciclofaixas, em São Paulo, ou o BRT, em Belo Horizonte, são alguns exemplos de
transporte coletivo que começam a ser incentivados em capitais, como prevê a
norma.
"Nos últimos cinco anos, houve avanços nas obras de
mobilidade pública mais preocupadas com o transporte de massa. O conceitual já
foi resolvido, agora vêm os investimentos", afirma o pesquisador do Ipea
Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho.
A crise pode ter causado reflexo na liberação de recursos. A
estimativa do BNDES é que seja necessário investir R$ 234,78 bilhões em
transporte público para resolver os problemas de mobilidade urbana nas 15
principais regiões metropolitanas do país.
Apesar dos recursos escassos, o chefe do departamento de
mobilidade urbana do BNDES, Rodolfo Torres, considera que este é o momento de
planejar. "São Paulo e Rio estão mais avançados. No caso do Rio, também
por causa da Olimpíada. Mas outros casos começam a sair do papel, como o metrô
de Salvador."
AINDA FALTA MUITO
Mesmo com os avanços, o transporte público no Brasil está
longe do que seria considerado razoável.
Para o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de
São Paulo, Gilberto Belleza, é necessário investir mais em metrô, em ônibus e
em vias públicas.
"Não podemos pensar só na quantidade de veículos. É
preciso pensar a mobilidade urbana de forma geral, com sistemas de acesso,
calçadas, pontos de ônibus adequados, identificação das linhas que passam
naquele ponto. Enfim, pensar a mobilidade urbana integrada ao desenvolvimento
da cidade."
Coordenador de engenharia do Mackenzie Campinas, Luiz
Vicente Figueira de Mello considera que é necessário reduzir o deslocamento das
pessoas pela cidade e sugere a diminuição do ISS (tributo municipal) para
empresas que mudarem o horário de entrada e saída de funcionários.
Neste sentido, o plano diretor pode ser um grande aliado.
Incentivar que as pessoas possam trabalhar mais perto das suas casas é também
uma maneira de tornar a mobilidade melhor e evitar que mais moradores queiram
deixar os grandes centros urbanos.
Pesquisa da Liberty Seguros mostra que 82% gostariam de
morar em uma cidade onde moradia, trabalho e lazer estivessem a apenas 20
minutos a pé ou de bicicleta.
"Os grandes problemas da política nacional de
mobilidade urbana são inércia e falta de recursos. A norma entrou em vigor em
abril, mas até agora poucos municípios conseguiram concluir seus planos,
simplesmente porque não sabem por onde começar", dizem Marcos de Sousa e
Regina Rocha, representantes do site Mobilize-se (dedicado à mobilidade
urbana).
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300 cidades
no mundo importaram o sistema de transporte público de
Curitiba; município é referência no assunto
82%
dos brasileiros gostariam de morar em uma cidade onde
moradia, trabalho e lazer estivessem a 20 minutos a pé ou de bicicleta
Bogotá, Santiago e
Estocolmo são exemplos
Melhorar a mobilidade nas grandes cidades não é impossível.
Cidades como Bogotá, na Colômbia, e Santiago (Chile) são exemplos na América
Latina de que é possível reformar o transporte público. Estolcomo, na Suécia,
Londres, no Reino Unido, e Barcelona, na Espanha, também são fontes de boas
soluções.
"Esses lugares entenderam há muito tempo que é
necessário pensar a cidade como um todo e que todos os aspectos estão
relacionados", afirma o arquiteto Ciro Pirondi, diretor da Escola da
Cidade.
Inspirado no sistema de transporte público de Curitiba,
Bogotá apostou no veículo leve sobre pneus (VLP) para resolver o problema de
mobilidade na cidade.
O modelo paranaense ganhou melhorias: o chamado TransMilenio
colombiano permite que se façam ultrapassagens, o que aumenta a velocidade dos
ônibus.
"Bogotá chegou a ter um colapso no transporte público,
porque muita gente migrou para o coletivo. É claro que o ideal é o equilíbrio
entre os modais, mas isso mostra que, quando o transporte público funciona, há
um incentivo natural para usá-lo", diz Luiz Vicente Figueira de Mello, do
Mackenzie.
O transporte público de Santiago, capital chilena, é
considerado um dos melhores da América Latina.
O Transantiago teve toda a operação da rede integrada em
2007. O sistema anterior era operado por mais de mil operadores independentes,
com itinerários redundantes e ônibus antigos. A cidade tem cinco linhas de
metrô interconectadas e rápidas.
Em Estocolmo, a integração de ônibus, metrô, bondes e até
barcos foi a saída encontrada para garantir a mobilidade. Além disso, a cidade
instituiu o pedágio urbano.
Num primeiro momento, o pedágio seria cobrado por seis meses
e depois a população seria consultada sobre sua permanência.
"O sistema deu certo e os moradores pediram a volta do
pedágio urbano", afirma Luiz Vicente Mello.
"Cidades como Estolcomo, Londres e Milão optaram pelo
pedágio urbano e acho que é uma opção", diz o arquiteto, urbanista e
professor emérito da FAU-USP, Candido Malta Campos Filho.
Já Barcelona aproveitou a realização dos Jogos Olímpicos de
1992 para modernizar o transporte coletivo da cidade –assim como tenta fazer,
agora, o Rio de Janeiro.
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3,8 milhões
é o número de passageiros transportados em 2014 pelo metrô
de São Paulo
R$ 30 milhões
é o custo por quilômetro do BRT; o VLT custa R$ 60 milhões
45 mil
pessoas circulam por hora no sistema de transporte público
da cidade de Bogotá, na Colômbia