12/09/2017 10:33 - Revista Technibus
ALEXANDRE ASQUINI
Pelo menos 1.400 técnicos, especialistas,
pesquisadores, empresários e autoridades
das três esferas de governo participaram
nos três últimos dias de junho
de 2017, em São Paulo (SP), do 21º Congresso
Brasileiro de Transporte e Trânsito
e da X Exposição Internacional de Transporte
e Trânsito, eventos promovidos
pela Associação Nacional de Transportes
Públicos (ANTP). O encontro, de caráter
bienal, havia acontecido uma única vez
na capital paulista, em 1995.
Foram desenvolvidos 60 painéis e oficinas
em diferentes áreas, varrendo praticamente
todo o espectro de interesses
no setor da mobilidade urbana. Os arquivos
com as apresentações liberadas pelos
autores estão sendo gradativamente
inseridos na biblioteca virtual na ANTP
(www.antp.org.br) e podem ser consultados
sem restrições por quaisquer
interessados. Houve também sessões
específicas para apresentação de 256
trabalhos técnicos – todos já disponíveis
para livre consulta na biblioteca virtual,
conforme informou o superintendente da
ANTP, Luiz Carlos Mantovani Néspoli.
O presidente da ANTP, Ailton Brasiliense
Pires, afirmou estar satisfeito com
o resultado do 21º Congresso, assinalando
que, apesar das dificuldades impostas
pela situação econômica, houve pleno
êxito quanto ao conteúdo técnico e
aos debates. Para Cláudio de Senna Frederico,
vice-presidente da ANTP, a integração
entre as salas onde aconteciam os painéis e a área onde se desenvolvia
a exposição de produtos e serviços favoreceu
a interação entre os participantes.
ANTP, 40 ANOS
Neste 21º Congresso,
a ANTP promoveu uma sessão comemorativa
dos seus 40 anos, com a participação
de personalidades que atuaram
e ainda atuam na organização, em especial,
do engenheiro, consultor e atualmente
presidente do Conselho de Administração
da São Paulo Transportes
(SPTrans), Plínio Assmann, que presidiu
o Metrô-SP na época crítica de sua implantação
e foi o idealizador e fundador
da ANTP em 30 de junho de 1977.
No encontro, foi lançado o livro
“ANTP 40 Anos. Sonhar ainda é preciso.” Também foi apresentado o livro “Mobilidade
humana para um Brasil urbano”,
igualmente editado pela ANTP, que reúne 150 experiências práticas em transporte
urbano. As versões eletrônicas
dessas publicações podem ser baixadas
a partir do site da ANTP.
ÔNIBUS, TARIFAS E QUALIFICAÇÃO
Logo na abertura do 21º Congresso,
ficou claro que um dos temas mais significativos
para o setor neste momento é a
questão tarifária, por afetar os usuários,
afligir os gestores municipais e impactar
economicamente as operadoras.
O presidente da Frente Nacional de
Prefeitos (FNP) e prefeito de Campinas
(SP), Jonas Donizette, situou a mobilidade
ao lado da saúde e da segurança
como os três principais problemas das
grandes cidades. Disse que a atual relação das cidades com o modelo de transporte
centrado nos veículos individuais
precisa ser revista, e que é necessário
encontrar um modo de garantir o fortalecimento
do transporte coletivo. “Se
tem um assunto que interessa à população, é o transporte coletivo, em relação
aos custos e às melhorias. Temos que,
cada vez mais, trabalhar por um transporte
de qualidade e um preço que não
pese no bolso do cidadão”, assinalou.
A Frente Nacional de Prefeitos propôs a criação da Cide Municipal, ideia
defendida também pelas empresas
de transporte por ônibus e por
outros setores como um dos caminhos
para o financiamento permanente
do transporte público urbano.
A Cide Municipal depende de
aprovação e promulgação de uma
emenda constitucional específica,
objeto de propositura em tramitação
no Congresso, já aprovada
em Comissão Especial. Se essa emenda
constitucional vier a ser aprovada do
modo como está atualmente redigida,
autorizará municípios e o Distrito Federal
a instituírem uma contribuição sobre
a venda a varejo de gasolina, etanol e
gás natural veicular, destinando a receita
ao custeio do serviço do transporte público coletivo.
PRIORIDADE E SUBVENÇÃO
O presidente
da Associação Nacional das Empresas
de Transporte Urbano (NTU), Otávio
Cunha, aprofundou a questão, focalizando
aspectos referentes à atual situação do
transporte público por ônibus. Disse que,
a partir de 2013, houve queda de 18% da
demanda do transporte por ônibus nas cidades,
com redução de velocidade comercial
em função dos congestionamentos. E
frisou que, nos últimos quatro anos, ganharam
força reivindicações da sociedade
por melhor qualidade de transporte, viagens
mais rápidas, maior transparência e
tarifas reduzidas.
Ele acrescentou que, desde o fim da Empresa Brasileira de Transportes Urbano (EBTU) – estatal federal criada em 1975 e extinta em 1991 –, deixou de haver um organismo federal voltado para o estabelecimento das políticas públicas do transporte, e que o setor “está pagando um preço muito alto por causa disso”.
O dirigente pondera que, com a edição
da Constituição de 1988, os municípios
assumiram a atribuição do planejamento,
fiscalização e organização dos serviços de transporte, mas têm poucos recursos
para poder fazer as intervenções
e os investimentos significativos que
precisam ser feitos.
Otávio Cunha falou em “pressão” ao advogar a necessidade da busca da melhoria da mobilidade por meio do planejamento, com os planos de mobilidade e com outras ações, entre as quais está a efetivação da prioridade ao transporte público no sistema viário. “Acho que temos obrigação de pressionar as autoridades constituídas e pressionar o Congresso para procurar estabelecer exatamente isso: políticas públicas de transporte que beneficiem o transporte público em detrimento do transporte individual.”
Assim como Jonas Donizette, o
presidente da NTU defende a alteração
da política tarifária e a criação
de uma sistemática permanente, que garanta
subsídios às tarifas que não onerem
o usuário e nem desbastem ainda
mais os combalidos orçamentos municipais.
“Não é possível que o usuário banque
todo o custo desse serviço enquanto
toda a sociedade e também a produção
– a indústria, o comércio e os serviços –
se beneficiam da existência de um bom
serviço de transporte. Precisamos introduzir
a ideia da subvenção, com Cide
Municipal.”
CÁLCULO DA TARIFA
Outro ponto considerado importante por gestores municipais e operadores do transporte por ônibus é a constituição de uma nova metodologia para cálculo tarifário, capaz de substituir a obsoleta “Planilha Geipot”, elaborada ainda na época da extinta Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes (EBTU) e atualizada pela última vez em 1996. Uma sessão do 21º Congresso da ANTP focalizou a estruturação de uma nova metodologia para levantamento de custos dos serviços de transporte público por ônibus nas cidades brasileiras. Essa nova metodologia, já concretizada pela ANTP, é fruto de mais de três anos de trabalho técnico, com participação da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Públicos de Mobilidade Urbana e da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos.
OUTROS
PONTOS
Outras sessões trataram diretamente da qualificação e do aprimoramento operacional dos sistemas de urbanos de ônibus, focalizando o tema da implantação dos planos de reestruturação de redes de ônibus, a relevância de ferramentas avançadas no planejamento e programação para o transporte público, a questão da operação controlada dos sistemas e um ponto que é recorrente e básico na melhora do desempenho do transporte pú- blico por ônibus: a prioridade para trafegar no sistema viário, sem dividir espaço com os automóveis.
QUESTÃO METROPOLITANA
Duas sessões do 21º Congresso da ANTP focalizaram mais objetivamente o tema da mobilidade em regiões metropolitanas e aglomerados urbanos. Uma das sessões examinou o tema do ponto de vista da organização, racionalização e redução de custos dos serviços de transporte público urbano, com base na ideia de evitar a duplicação de investimentos e a concorrência entre serviços de transporte. Outro painel discutiu a possibilidade de instituição da autoridade metropolitana para coordenação autônoma dos serviços de mobilidade.
O secretário municipal de Mobilidade
e Transportes de São Paulo, Sérgio Avelleda,
participou das duas sessões e destacou
que houve convergência dos debatedores
quanto à constatação de que
nos aglomerados urbanos brasileiros,
formados por distintas cidades, acontece
o que foi qualificado como “um desarranjo
institucional”.
Ele avalia que o fenômeno do transporte deixou de ser municipal e passou a ser efetivamente metropolitano, embora a estruturação institucional siga com a lógica da Constituição de 1988, segundo a qual, dentro do município, a competência deve ser exclusivamente municipal e no transporte entre os municípios deve ser de exclusiva competência do governo estadual.
Avelleda defendeu a criação de uma
autoridade metropolitana, afirmando
que o modelo atual é ineficiente, pois
gera sobreposição de decisões e não favorece
a integração operacional e tarifária,
impedindo a redução de custos e
o aumento da qualidade do transporte.
Em outra sessão do 21º Congresso, o deputado federal Hugo Leal, presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro, tocou nessa questão de outra maneira, afirmando que a seu ver é necessário haver a integração dos três níveis de governo para que haja garantia de um sistema de transporte realmente de qualidade para a população. “A mobilidade urbana não pode ser pensada de forma estanque pelos governos estaduais ou pela prefeitura: é preciso um planejamento integrado”, afirmou, acrescentando que a mobilidade urbana e o sistema de transportes devem seguir o mesmo modelo de gestão da saúde e da educação, com o estabelecimento de divisão de responsabilidades e metas.
Também durante o 21º Congresso, o
Instituto do Movimento Nacional pelo
Direito ao Transporte Público de Qualidade
para Todos (Instituto MDT) fez o
lançamento da proposta de um pacto da
sociedade pelo transporte como direito
social, incluindo a instituição, por lei, de
um Sistema Único de Mobilidade Sustentável
(SUM), que tem como uma de
suas principais características a concentração
dos recursos financeiros em fundos
especiais, instituídos por lei, para o
financiamento das ações de mobilidade
urbana.