A importância dos modos não motorizados nas cidades de pequeno porte no nordeste do Estado de SP

13/03/2016 12:00 - Isabel Fleury Azevedo Costa

Ensaio Crítico apresentado no Curso de Gestão da Mobilidade Urbana da ANTP

A Política Nacional de Mobilidade Urbana regida pela lei 12.587 de 2012 institui como diretriz central a hierarquização dos meios de transporte com a seguinte estrutura: Pedestre, Ciclista, Transporte Público Coletivo, Transporte de Carga e Automóveis Particulares. Essa configuração coloca como máxima prioridade o foco das intervenções em projetos de mobilidade nos modos não motorizados.

Ao mesmo tempo a Política Nacional apresenta indicadores de conteúdos mínimos que deverão ser apresentados sem uma regra de formato ou padrão, sem um apontamento item a item de como ela deverá ser feita. Sua regulamentação em formato de lei é apontada como importante, porém não obrigatório segundo Ministério das Cidades. Essa flexibilidade demonstra a compreensão da complexidade do tema e principalmente da singularidade município a município no enfrentamento do assunto. Conforme Rogério Belda a estruturação legal sobre a mobilidade urbana de cada município é flexível diferente do arcabouço legal que estamos acostumados em que a esfera federal aponta a cada município como e de que forma deverá ser feita e fiscalizada.

Apesar de entendermos que de fato a mobilidade urbana está diretamente ligada a estrutura espacial do território e da interação dos indivíduos nesse território, também foram ressaltadas as diretrizes prioritárias que se vinculam à equidade do acesso e sua distribuição. Nesse sentido os modos não motorizados abrangem de forma mais igualitária um leque maior de pessoas dentro da nossa sociedade.

Se considerarmos municípios de 20.000 a 40.000 habitantes, municípios de pequeno porte, na região nordeste do estado de São Paulo, suas manchas urbanas não ultrapassam os 3,5km de distância partindo do centro. Como por exemplo Casa Branca com uma distância máxima de 2,8km do centro ou Tambaú com 2,5km e Vargem Grande do Sul com 3,2km.

Esse padrão de ocupação urbana nessa região do estado paulista, vem apresentando índices de motorização elevadíssimos se considerarmos que são cidades prioritariamente de deslocamentos caminháveis. Consultando dados do IBGE podemos montar estatísticas que apresentam Casa Branca com uma taxa de motorização de 42,9%, Tambaú com 44,4% e Vargem Grande do Sul com 44,1%.

Diante deste cenário e do momento crítico da mobilidade urbana brasileira nos grandes centros acredito que poderíamos repensar a estrutura de intervenção do Plano de Mobilidade com um viés distinto para os municípios com menos de 40.000 habitantes. A ampla estrutura abordada para as pesquisas de deslocamentos apresenta os modos motorizados com maior ênfase, tendo uma relação de via e passeio com o mesmo destaque. Se invertermos essa condição para uma priorização total das intervenções focadas nos passeios para os municípios até 40.000 habitantes estaríamos sendo mais realistas e mais efetivos.

Ano a ano acompanhamos a dificuldade da gestão econômica dos municípios brasileiros, o que se acentua nos municípios de menor porte. As equipes técnicas internas não possuem expertise no assunto, ou até, são insuficientes em número de envolvidos.

Além da questão técnica da Mobilidade Urbana enfrentamos no Brasil uma leitura coletiva de que o melhor gestor é aquele que mais quilômetros quadrados pavimenta. O que claro, está diretamente vinculado ao valor social que representa o automóvel na nossa sociedade.

Existe já muito arraigado na nossa cultura o olhar do automóvel além de meio de transporte, mas também como bem material e de status perante a sociedade. Propor um rompimento desse paradigma dentro da estrutura de planejamento da mobilidade urbana nos municípios menores, deixando como elemento central o ser humano e sua interação com a cidade em que se vive, acredito ser o ponto primordial no processo de inversão da pirâmide proposta na Política Nacional de Mobilidade Urbana.

Democratizar o uso dos espaços urbanos é gerar acessibilidade a todos e da forma mais diversificada possível. Diante da estrutura social em que vivemos os recursos que viabilizam os deslocamentos são bem desequilibrados, sendo o percurso a pé aquele que nos coloca em pé de igualdade. Perder essa grande oportunidade em cidades ainda prioritariamente caminhável é perder a democratização de seus espaços públicos é diminuir a qualidade urbana que tanto desejamos.

Isabel Fleury Azevedo Costa - Arquiteta e urbanista, mestrado em Urbanismo pela “Universidad Politécnica de Cataluña”, Barcelona, com pós-graduação em Mobilidade Urbana pela “Delft University of Tech­nology”, Delft, Holanda. Atualmente, no escritório Solu Paisagem e Território, desenvolve Planos Diretores e de Mobilidade Urbana com ênfase nas propostas estratégicas de sistemas verdes urbanos.