06/02/2015 15:00 - Frederico Bussinger
"Inútil dormir que a dor não
passa...” - ["Bom Conselho” – Chico Buarque]
"Em casa onde falta o pão, todos
brigam, ninguém tem razão." [Tradicional provérbio Português]
Pontos-chave:
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1) Curitiba-PR, que tem sido apontada, nacional e
internacionalmente, como um benchmarking do transporte coletivo urbano; de
mobilidade, mais amplamente, vê o futuro do seu sistema ameaçado. Será nossa Bastilha?
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2) Além do enfrentamento de tabus, medidas estruturantes
precisam e vêm sendo buscadas.
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3) A novidade é que, após várias rejeições, o Governo
Federal decidiu "des-zerar” a alíquota da CIDE e, com isso, gerar recursos
anuais estimados em R$ 14 bilhões.
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4) A esperança, por sua vez, alentada pelo setor, é que o
escopo da CIDE possa ser ampliado, passando a abranger, também, investimentos
e custeio no transporte público.
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Ainda que não tenha sido pioneira na implantação de
corredores de ônibus, integração tarifária, e vários outros instrumentos
tecnológicos, institucionais, operacionais e gerenciais, Curitiba-PR tem sido
um laboratório a amalgamá-los. Por isso, já há algumas décadas, é normalmente
apontada, nacional e internacionalmente, como um benchmarking do transporte coletivo urbano; de mobilidade, mais
amplamente.
Nos últimos anos, todavia, verdades (aparentemente) ali
consolidadas voltaram a ser discutidas. P.ex.: Estudos para implantação de metrôtrouxeram à baila, na prática, os limites dos sistemas sobre pneus (defendidos,
por alguns, como suficientes e, até, sucedâneos dos de alta capacidade). A
utilização do transporte coletivo pelos moradores lindeiros revisitou reflexões
sobre o papel adensador de corredores.
E, no passado recente, de lá chegam notícias que podem
comprometer a própria estrutura e funcionamento de sistema que integra 13
municípios daquela região metropolitana e transporta cerca de 2 milhões/dia;
sistema que foi referênciapara tantas outras cidades brasileiras, da América Latina e, até, da Ásia:
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Na contramão do que mundialmente se propugna,
mormente ante a crescente (i)mobilidade das grandes cidades e dos desafios
ambientais, o número de passageiros no sistema de transporte público vem
declinando: De 26,5 milhões para 25 milhões passageiros/mês, desde 2010. Aliás,
um fenômeno não
apenas curitibano.
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Tal redução, além dos aspectos urbano-ambientais,
tem também sua dimensão econômico-financeira: As receitas do sistema vêm
proporcionalmente sendo reduzidas.
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Nesse ano, os serviços já foram parcialmenteparalisados meia dúzia de vezes; totalmente nos dias 26 e 27/JAN.
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A justificativa dos trabalhadores tem sido o atraso
de pagamento, que vem ocorrendo nos salários e 13º desde o final do ano
passado;
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A justificativa das empresas de ônibus é o atrasodo aporte de subsídios pelo Governo do Estado; que já acumula R$ 16 milhões.
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O governadoranuncia que não irá renovar o convênio que mantem a "Rede Integrada de Transporte Coletivo” (RIT);
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A integração tarifária metropolitana, implantada
e mantida desde 1980, malgrado diferenças partidárias entre governadores e
prefeitos, ao longo desse período, tem seu futuro ameaçada: Tudo
indica que a metropolitana ficará acima da urbana que, a partir desta semana, passoua ser de R$ 3,30.
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A Prefeitura de Curitiba alega que, desde 2004
"as contas deixaram de fechar”; tendo, inclusive, produzido e veiculado um
didático vídeopara explicar seu ponto de vista. E o prefeitoavalia que Curitiba "vive a pior crise
dos últimos 10 anos”.
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Tal descompasso deve ainda crescer, em Curitiba
e em todas as cidades brasileiras, em função da retomada da CIDE(Lei
nº 10.336/2001) que, se no médio e longo prazo traz perspectivas de
financiar novos investimentos e/ou custeios, de imediato impactará os custos
operacionais pela elevação de R$ 0,15 no preço do óleo diesel.
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E, como não poderia deixar de ser, como a partir
dos movimentos de 2013, passou a haver divergênciaquanto aos cálculos dos custos; já não só entre sociedade e poder público mas,
agora também, entre as diversas instâncias e órgãos governamentais envolvidos.
Ao contrário do provérbio português, em epígrafe,
aparentemente cada um tem um pouco de razão...
Sobre-carregamento dos veículos de transporte coletivo
(ônibus, metrô e trens); redução e/ou não expansão proporcional de frotas;
fusão e/ou eliminação de linhas; postergação de renovações de veículos;
déficits e necessidade de subsídios crescentes são algumas notícias que nos
habituamos a ouvir Brasil afora (01, 02, 03); mormente nas grandes
metrópoles. Greves, depredações, queima de ônibus, alegados como
eventos derivados, de igual forma.
Agora, pelo noticiário, parece que Curitiba vai
paulatinamente se incorporando a esse dramático cenário; preocupante não apenas
para a população curitibana mas, pelo papel simbólico, para todo o País: Seria
uma Bastilha do transporte público brasileiro?
Transporte público de qualidade é caro; mesmo! Subsídio não
é "pecado” (desde que com fontes identificadas e beneficiários explicitados;
tudo transparentemente). Mas, além do enfrentamento desses tabus, soluções
estruturais precisam e vêm sendo buscadas há algum tempo; com inflexão
importante a partir das mobilizações de 2013 (01, 02, 03).
A novidade é que, após várias
rejeições, o Governo Federal decidiu "des-zerar”
a alíquota da CIDE (reduzida a 0% desde
2012). E, com isso, gerar recursos anuais estimados em R$ 14 bilhões. A
esperança, por sua vez, alentada pelo setor, é que seu escopo possa ser
ampliado; passando a abranger, também, investimentos e custeio no transporte
público.
Frederico Bussinger, ex-secretário de Transportes de São Paulo;
presidente da CPTM e SPTRANS; e diretor do Metrô/SP