11/04/2016 07:31 - Otávio Cunha
Temos uma oportunidade única em nossas mãos: criar um fundo municipal exclusivamente dedicado ao custeio do transporte público! Trata-se da Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que cria uma contribuição incidente sobre a venda (varejo) de combustíveis derivados do petróleo (gasolina óleo diesel e gás natural) e do etanol hidratado. Essa PEC é inovadora e alinhada com as demandas sociais atuais, pois estabelece uma fonte de receita contínua que poderá representar uma completa transformação do panorama atual da mobilidade urbana. A promulgação dessa PEC significará que os municípios terão finalmente a capacidade de direcionar recursos financeiros diretamente para ofertar melhores serviços e com tarifas mais baixas.
O mecanismo de transformação é surpreendentemente simples. A PEC daria o direito a cada município de adotar um pequeno incremento no custo dos combustíveis praticado junto ao consumidor final. A cada litro de combustível consumido, uma parcela seria transferida para um fundo sob controle exclusivo do município. A partir dos recursos reunidos nesse fundo, seria possível usá-lo no custeio do transporte público. Considerando o consumo nacional de gasolina, óleo diesel, etanol hidratado, gás natural veicular e gás de petróleo liquefeito (2014) e o preço desses combustíveis, obter-se-ia cerca de R$12 bilhões com a adição de R$0,10 centavos para cada litro consumido. Esse montante de recursos equivale aproximadamente a 40% dos custos atuais de operação do transporte coletivo por ônibus, que atende mais de 3.313 municípios e transporta cerca de 87% das viagens do transporte público.
Uma das principais implicações da PEC da CIDE Municipal é o rompimento do sistema atual que penaliza o usuário do transporte público e limita as possibilidades de atuação do poder público. Diferentemente do sistema atual, onde a qualidade dos serviços é definida em função da capacidade de pagamento dos usuários, que são normalmente oriundos das classes socioeconômicas mais pobres, os recursos dos fundos municipais de mobilidade urbana seriam o parâmetro fundamental para especificação dos serviços. Considerando o fato inexorável de que serviços de qualidade têm um custo elevado, esses recursos seriam utilizados para garantir que a tarifa não seja reajustada regularmente. Em um estudo preliminar da Fundação Getúlio Vargas (FGV), constatou-se que a adoção da CIDE Municipal contribuiria para a redução de 40% da tarifa e produziria um impacto negativo de 0,026% sobre o índice inflacionário.
Mundialmente, a prática de subvenção do transporte público urbano é essencial para aumentar a qualidade do serviço ofertado. Na verdade, as principais cidades (Londres, Paris, Madri, etc.) dos países desenvolvidos contratam e pagam por serviços de alta qualidade tendo como base recursos orçamentários especificamente dedicados ao transporte público. Toda a receita tarifária é revertida para abater os custos de contratação das empresas operadoras. Assim, na maior parte dos casos, o poder público arca com mais de 50% dos custos, para que a população tenha acesso a serviços de altíssimo padrão de qualidade.
Depois de muitos anos debatendo a situação do transporte público urbano no Brasil e diante da oportunidade que se apresenta, é o momento de construir uma base ampla de apoio à iniciativa da PEC da CIDE Municipal. A NTU tem participado de eventos sobre o assunto e já observou o crescente alinhamento dos principais atores envolvidos na mobilidade urbana. Cada vez mais, consolida-se o entendimento de que é inviável ofertar serviços de qualidade sem a disponibilização de recursos adicionais para os municípios. A partir desse entendimento, há que se construir um processo de engajamento com o Congresso Nacional, para que a magnitude dessa iniciativa legislativa possa ser corretamente compreendida e assim seja possível alcançar essa tão esperada conquista para a população brasileira.
Otávio Vieira da Cunha Filho- Presidente executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos - NTU