13/08/2014 06:38 - Valor Econômico
A Federação Nacional dos Engenheiros (FNE), entidade que
representa 500 mil profissionais, concluiu há poucos dias um documento com uma
proposta de reindustrialização para o país. O relatório ressalta a necessidade
principalmente de que o Brasil dê prioridade nos próximos anos aos
investimentos em infraestrutura, como em ferrovias, transporte fluvial, na
geração de energia, em petróleo, gás natural e biocombustíveis, além da
universalização da comunicação e do saneamento.
A intenção é discutir a proposta com alguns candidatos a
governadores de Estado e com os presidenciáveis. A FNE entende que com o foco
nesses setores econômicos, aliado a mais recursos para inovação e educação,
será possível o Brasil crescer a 6% ao ano e chegar a uma taxa de investimentos
de 25% do PIB. Há alguns anos o país não ultrapassa 20% na taxa de investimento
e o PIB do ano passado, apenas para comparação, teve uma elevação de apenas
2,3%.
O diagnóstico da FNE, de acordo com Murilo Celso de Campos
Pinheiro, presidente da federação, é o de que o país vive um processo de
desindustrialização relativa e que a indústria deveria ser colocada como
prioridade dos governantes, sendo necessário reativar os investimentos públicos
e privados no setor produtivo. Para isso, é preciso que seja "reequilibrado
o câmbio no sentido da maior competitividade industrial" e haja o
"adensamento" de cadeias produtivas, com o país estimulando a
produção nacional de bens intermediários e criando condições para a
industrialização nacional de insumos agropecuários e minerais.
Pinheiro destaca que para haver mudanças em prol da produção
industrial será preciso ainda juros básicos "bem mais baixos" para
viabilizar o investimento produtivo, a expansão e modernização dos parques
fabris, e a adoção de uma política industrial que integre iniciativas
creditícias, tributárias, de promoção das exportações e estímulo para a
produtividade e inovação. Também defende que haja elevação dos recursos para
ciência e tecnologia de cerca de 1% para 3% do Produto Interno Bruto (PIB).
Segundo Pinheiro, o dólar - entre R$ 2,20 e R$ 2,30 -,
embora menos valorizado do que há dois anos, segue enfraquecendo a indústria
nacional. "A combinação de ações de agentes do mercado e de atuações do
Banco Central têm levado a taxa efetiva de câmbio a um patamar desfavorável ao
investimento produtivo no país. Esse patamar artificial estimula a importação,
reduz as margens da indústria no Brasil e no médio prazo acaba desestimulando a
produção no país", diz ele, preferindo não estimar quanto seria o câmbio
que daria competitividade ao setor.
"Acho que temos que pensar no curto prazo em melhorar
as margens [de lucro] da indústria. Se você não tiver "um câmbio
razoável" e investimento, não tem crescimento. E não são medidas simples,
pois afetam alguns mecanismos de controle da inflação", disse Pinheiro,
lembrando que o câmbio tem sido manejado prioritariamente com foco na
desaceleração de preços.
Na questão do transporte de cargas, o estudo da FNE trata,
entre outros aspectos, da necessidade de o país dar prosseguimento à expansão e
recuperação de ferrovias e de incentivos ao transporte fluvial. Em relação à
energia, ressalta a necessidade de investimentos em fontes renováveis e no
aumento da eficiência, através de cogeração de energia, por exemplo. Sobre
petróleo, gás e biocombustíveis, a entidade afirma que devem ser priorizados os
fornecimentos de bens e serviços nesses ramos pela indústria de capital
nacional e ressalta também a necessidade de recuperação da produção de álcool e
ampliação dos demais biocombustíveis.
Já sobre saneamento, o documento diz que é preciso que seja
de fato efetivado o investimento previsto até 2033 por meio do Plano Nacional
de Saneamento, de R$ 508,4 bilhões, para se alcançar as metas de 99% de
cobertura no abastecimento de água potável e de 92% no esgotamento sanitário.
Sobre comunicações, o relatório defende que seja realizado um programa do tipo
"Comunicações para Todos", similar ao "Luz para Todos",
para universalizar o acesso à telefonia, além de defender investimentos para
que o acesso à internet também seja universal.
=x=x=
Governo aposta no crédito, sem resultado garantido
Principal alvo de medidas é impulsionar o financiamento de
veículos e o consignado
Tudo indica que o governo ainda não esgotou o arsenal de
medidas para tentar estimular o crédito na esperança de que essa estratégia dê
algum impulso à economia, bastante debilitada a poucos meses das eleições. O
desempenho das operações de empréstimos desapontou no primeiro semestre, com um
crescimento acumulado em 12 meses de 11,8%, que levou o estoque para R$ 2,8
trilhões, inferior aos 12% projetados conservadoramente pelo Banco Central
(BC). Será o pior ano para o crédito desde 2003. As concessões, que refletem as
novas operações, cresceram menos ainda, 8,7% em 12 meses.
Não fosse a arrancada dos bancos públicos, o resultado teria
sido pior. A carteira das instituições de controle estatal cresceu 17,1% em 12
meses, enquanto a das privadas nacionais aumentou 5,6%, e a das estrangeiras,
8,1%. O governo se mostrou particularmente decepcionado com duas linhas que
alimentaram o consumo nos anos anteriores, o financiamento de veículos, cujo
estoque encolheu 3,7% nos 12 meses terminados em junho, e o consignado, que
cresceu 13,7% no mesmo espaço de tempo.
Dois pacotes para estimular o crédito foram anunciados em
apenas duas semanas e há sinais de mais coisas a caminho. O primeiro saiu do
forno pouco antes de serem divulgados os números do primeiro semestre e tem a
ambição de injetar R$ 45 bilhões no mercado, com a liberação de recursos dos
depósitos compulsórios. De R$ 194 bilhões em 2009, os compulsórios chegaram a
R$ 402,4 bilhões no fim do primeiro semestre, saltando R$ 40 bilhões em um ano.
O principal alvo dessas medidas é impulsionar o
financiamento de veículos e o consignado. Por isso, houve um ajuste nas
exigências de capital para essas operações que, na prática, diminui o total
requerido. Outra medida permite que os bancos cumpram até metade do compulsório
sobre depósitos a prazo com novas operações de crédito para pessoas físicas ou
empresas ou a compra de carteiras já existentes.
Alguns dias depois, o Conselho Monetário Nacional (CMN)
aprovou medidas para financiar os investimentos, inclusive no setor rural. Uma
das novidades mais importantes foi a alocação de R$ 30 bilhões do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para o Programa de
Sustentação do Investimento (PSI) para a compra de ônibus, caminhões e bens de
capital a taxas inferiores à TJLP que, a 5%, já é bastante baixa.
Nesta semana veio à tona que o Ministério da Fazenda avalia
com o da Justiça e instituições financeiras medidas para facilitar e agilizar a
retomada de bens financiados em caso de inadimplência com o objetivo de
impulsionar o financiamento de veículos. O governo pretende enviar ao Congresso
ainda neste semestre uma proposta para alterar o Código Civil e implementar as
novas regras (O Globo, 11/8).
Pouco depois do anúncio das medidas de afrouxamento dos
compulsórios, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reuniu-se com banqueiros
para discutir os efeitos do pacote macroprudencial e ouviu a avaliação de que o
impacto seria modesto. Dada a desaceleração do crescimento da renda, não há
expectativa de uma expansão significativa do financiamento de veículos e do consignado,
como houve no passado. As famílias estão mais endividadas e receiam
turbulências no mercado de trabalho.
Algum alívio poderá ser registrado pelos bancos públicos,
que ampliaram muito suas carteiras nos últimos anos e estão perto dos limites
de alavancagem. Os bancos pequenos e médios também podem ter algum refresco com
a venda de suas carteiras, mas já pedem ao Banco Central que a venda de suas
letras financeiras possa ser considerada para efeito de enquadramento das
grandes instituições nas novas regras de cumprimento do compulsório, assim como
a das carteiras de crédito.
Apesar de terem considerado reduzidas as chances de aumento
do crédito neste ano em função das novas medidas, os grandes bancos
aproveitaram a ocasião para pedir mais folga de capital, alegando que o Brasil
adota regras mais rígidas que as de Basileia 3 (Valor, 6/8). Isso é verdade.
Mas a demanda parece paradoxal uma vez que os bancos possuem bilhões em crédito
pré-aprovado sem interessados. As três maiores instituições privadas aumentaram
a carteira de crédito em 7,4% no primeiro semestre, quatro pontos abaixo da
média do sistema.